Com mais militares a entrar e menos a sair, as Forças Armadas registaram, pela primeira vez numa década, um aumento do número de efetivos - perto de 700 a mais em 2020 -, em contraciclo com o decréscimo consecutivo que ocorria todos os anos, com a perda anual de um milhar de homens, em média.
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As associações de militares acreditam que a crise económica causada pela pandemia de covid-19 explica o fenómeno de maior procura - houve quase mais 800 novas entradas, segundo a tutela - e retenção, por "falta de alternativas" de emprego. O Governo aponta, antes, uma crescente atratividade da carreira.
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Segundo dados da Direção-Geral da Administração e Emprego Público (DGAEP), 2020 chegou ao fim com mais 662 militares nas fileiras, face a 2019. O saldo positivo fica a dever-se à conjugação de, pelo menos, três fatores: um crescimento no número de incorporações; uma diminuição das saídas voluntárias - menos 1189 do que em 2019; e a possibilidade de prorrogar contratos, uma medida excecional do Governo para fazer face ao impacto da pandemia e que já resultou em 281 contratos prolongados.
visibilidade pode ter ajudado
Sem indicar o total de efetivos em 2019, o Ministério da Defesa Nacional (MDN) referiu, ao JN, que no ano passado esse número foi de 26 630, o que diz ter representado "um ligeiro aumento face ao ano anterior". Em fevereiro, e perante o registo de mais 771 incorporações em 2020 - houve 3054 - relativamente ao ano anterior, o ministro da tutela, João Gomes Cravinho, disse, na comissão parlamentar da Defesa, acreditar que, em tempo de pandemia, "a maior visibilidade das Forças Armadas (FA) tenha concorrido para uma maior atratividade".
"Os sistemas de recrutamento conseguiram gerar o volume de candidaturas mais elevado dos últimos quatro anos e o terceiro mais alto da última década", destaca o MDN, que, no entanto, se escusou a fornecer informação sobre anos anteriores. "Os sinais positivos são resultado das políticas que têm sido implementadas pelo Ministério da Defesa Nacional, com destaque para o Plano de Ação para a Profissionalização do Serviço Militar", realça a tutela.
"vamos ver quantos irão ficar"
O argumento do Governo não convence, porém, as estruturas que representam os militares, que reiteram que as FA "não são atrativas" e acreditam que o resultado positivo de 2020 se deve "à crise" económica. "É um ano de forte desemprego, determinado pela pandemia. As pessoas que estão à procura de emprego têm o mercado fechado e veem nas Forças Armadas uma hipótese", analisa o tenente-coronel António Mota, presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA), que prevê que "o mesmo se vai passar em 2021".
"Nos últimos 10 anos, as incorporações têm descido; há um ano de pandemia e sobem 700. Isto acontece porque não há alternativa, e as pessoas, para terem emprego, vão para as Forças Armadas. Ou seja, é a pior razão de todas", lamenta o oficial. "Vamos ver quantos desses 771 a mais vão ficar", questiona, por outro lado, o cabo-mor Paulo Amaral, que preside à Associação de Praças e também atribui o aumento à crise.
Pormenores
Gestor de carreira - Uma das medidas do Plano de Ação para a Profissionalização do Serviço Militar é a criação da figura do gestor de carreira para militares em regime de contrato e de contrato especial. O objetivo é "assegurar o desenvolvimento de planos profissionais de carreira", e a implementação está prevista "a partir do segundo semestre de 2021".
Menos saídas - O Ministério da Defesa registou 2118 saídas de militares em 2020, menos 1189 do que em 2019. Saíram 225 da Marinha, 1717 do Exército e 176 da Força Aérea.