Chuvas de setembro levam ano hidrológico 2021/2022 a fechar como o terceiro mais seco. Previsões de um outono quente preocupam.
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A precipitação ocorrida no passado mês - nos primeiros 14 dias, era o quarto setembro mais chuvoso deste século - fez com que o ano hidrológico 2021/2022, que agora terminou, fosse o terceiro mais seco desde que há registos (1931), ultrapassado por 2004/05 e 1994/95, anos das maiores secas de que há memória no país. Com particularidades territoriais, tendo este ano hidrológico sido o mais seco na região Nordeste do território desde 1960. Enquanto em várias estações meteorológicas no Alentejo e Algarve tem chovido sempre abaixo do normal. Em termos nacionais, nos últimos seis anos a precipitação foi igual ou inferior à média.
A análise é feita ao JN pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), numa altura em que a Península Ibérica entra num novo ano hidrológico - decorre de 1 de outubro a 30 de setembro - em grave défice de recursos hídricos e com previsões de um início de outono seco e quente. Antecipando os peritos que a guerra pela água irá intensificar-se, sabendo-se agora que Espanha não cumpriu com os caudais do Tejo e Douro acordados na Convenção de Albufeira.
"É a partir de 2000 que se notam estes períodos secos e mais acentuados, com desvios cada vez maiores para a altura do ano", explica a climatologista do IPMA Vanda Pires. Sendo que nos últimos 21 anos, em 12 a precipitação total esteve abaixo da normal (série 1971-2000). Com uma "frequência maior na região Sul", com as estações de Vila Real de Santo António há nove anos com valores de precipitação acumulados abaixo da média e as de Alcácer do Sal e Faro há oito.
Movimento que se verifica também no Nordeste do país, com "valores de precipitação muito equivalentes aos do Alto Alentejo", num aumento da frequência de anos secos, adianta. A estação de Vila Real fechou o ano hidrológico com um défice na casa dos -600 milímetros. E Bragança superior a -450 mm.
Repercutindo-se na distribuição espacial da seca, com Bragança, a 15 de setembro, a ser a única região ainda em seca extrema. Juntamente com Vila Real, estão há dez meses em situação de seca, quando Faro está há 20 e Beja e Alcácer há 18. Sendo que este século, recorde-se, conta cinco dos dez anos mais quentes de sempre.
Repensar a agricultura
As previsões para o mês que agora arranca são pouco animadoras. Sendo outubro o balão de oxigénio dos anos hidrológicos - "em termos médios, é dos únicos meses com sinal positivo, quase sempre com precipitação acima do normal" -, os modelos apontam para um sinal negativo. Isto é, desmonta Vanda Pires, "para um mês de outubro não só mais seco, mas mais quente do que o normal". Sinal, se bem que mais fraco, que se estende a novembro.
Estando as previsões sujeitas a um grau de incerteza, nomeadamente devido à "atividade no Atlântico Norte", sublinha a climatologista, o Núcleo Regional Sul da Associação Portuguesa de Recursos Hídricos defende uma posição conservadora por parte das entidades responsáveis. "Sermos otimistas nestas circunstâncias é assumir alguma irresponsabilidade, devendo-se antes jogar com cautela dada a elevada incerteza".
Para os especialistas em recursos hídricos Joaquim Poças Martins e Rui Cortes, certo é que, perante um cenário de escassez cada vez mais recorrente, urge repensar a agricultura que se pratica em Portugal, responsável por 74% do consumo de água. Ao contrário do que Espanha faz, entende o diretor de Hidráulica da FEUP, Portugal deve seguir os exemplos de "Israel e da Holanda, que gastam pouca água e têm culturas de alto valor acrescentado".
A seca mais longa...
A seca de 1943-46 foi a mais longa registada nos últimos 65 anos. Em 1990-92 vivemos a segunda mais longa e em 1980-81 e 2004-06 as terceiras.
... e mais extensa
A seca de maior extensão territorial (100%) foi a de 2004-06. Tendo sido também a mais intensa, tendo em conta os meses consecutivos em que o país esteve em seca severa e extrema.
Todo o país em seca
As chuvas de setembro aliviaram a classe de seca mais grave, a extrema, no nosso país, confinada agora apenas à região de Bragança. A 15 de setembro, metade do território estava em seca moderada, 45,9% em severa, 3,1% em fraca e 0,8% em extrema.