Batido novo recorde de concessões de nacionalidade em 2019: são mais do dobro dos bebés nascidos. Brasil, Cabo Verde e Israel no topo dos requerentes.
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Em 2019, mais de 180 mil pessoas conseguiram obter nacionalidade portuguesa: é mais do dobro dos bebés nascidos em Portugal (81 351). O número é um recorde e o reflexo de uma lei que, ao longo dos anos, tem vindo a abrir cada vez mais as portas do país a novos migrantes. Em comparação com 2017, no ano passado houve mais 50 mil estrangeiros a tornarem-se portugueses. A maioria chega do Brasil, Cabo Verde e Israel.
Por dia, em média, há quase 500 estrangeiros a naturalizarem-se portugueses, 15 mil por mês. O número tem vindo a subir nos últimos anos e 2020 parece manter o ritmo. Até 30 de abril, já houve quase 50 200 pedidos de nacionalidade, segundo revelou ao JN o Ministério da Justiça.
Criada em 1981, a lei da nacionalidade já foi alterada oito vezes. A última mudança aconteceu em 2018 e permitiu que filhos de estrangeiros nascidos em Portugal tivessem direito à nacionalidade se um dos pais aqui residisse há dois anos. Até 2018, eram exigidos cinco anos.
O efeito dos sefarditas
Nos últimos três anos, o Brasil está no topo dos requerentes, seguindo-se Cabo Verde, Israel, Angola e Guiné-Bissau. Israel subiu em 2019, pela primeira vez ao top 5, e logo como o terceiro país com mais cidadãos a obter nacionalidade portuguesa. O fenómeno resulta da alteração à lei, aprovada por unanimidade em 2013, após apenas um mês de discussão, que permitiu que os descendentes de judeus sefarditas, expulsos da Península Ibérica durante a Inquisição, tivessem acesso à nacionalidade portuguesa. Basta apresentar um estudo genealógico que comprove que se é descendente de um judeu sefardita português. Foi uma questão de justiça histórica, mas há quem defenda que a lei se tornou num negócio para obter passaporte europeu e facilidades de vistos.
Desde 2015 e até abril deste ano, Portugal recebeu mais de 62 mil pedidos de descendentes de sefarditas, mais de 25 mil no ano passado. Os israelitas lideram os pedidos.
Os números levaram o PS a achar que se escancarou a porta e a propor uma alteração à lei para incluir a exigência da residência no país durante dois anos. Entretanto, após protestos recuou e pede apenas provas de ligação efetiva à comunidade nacional, através da língua, visitas regulares ou residência.
Na próxima semana, o grupo de trabalho encarregado de rever a lei, coordenado por Constança Urbano de Sousa, vai fazer audições sobre esta questão. Mas há mais alterações em cima da mesa, incluindo o acesso à nacionalidade por filhos de imigrantes a viver há um ano em Portugal (ler ao lado). A lei será votada na especialidade em julho e, a avançar, será a nona revisão. O PSD já criticou as alterações constantes. Ao JN, a deputada socialista disse concordar que "a lei da nacionalidade precisa de estabilidade, mas era preciso corrigir lacunas e injustiças".
Carta aberta
Sefarditas e a discórdia no PS
A proposta do PS para alterar a lei que dá acesso à nacionalidade por descendentes de judeus sefarditas portugueses, exigindo dois anos de residência no país, foi fraturante dentro do próprio partido. Os históricos Manuel Alegre, José Vera Jardim, Alberto Martins e Maria de Belém Roseira escreveram uma carta aberta a mostrar discordância por considerarem que a alteração era uma revogação da lei de 2013. Também Jorge Sampaio se mostrou incomodado. A polémica levou o PS a reformular a proposta. Mas ainda está tudo em aberto.
Quem pode pedir
Residir há seis anos
Um estrangeiro, maior de idade, que resida legalmente em Portugal há pelo menos seis anos pode pedir nacionalidade. O processo custa 250 euros, tem de apresentar registo criminal e provar ter conhecimentos de português, através de exame ou de um certificado de aulas.
Filhos de imigrantes
Também podem aceder à nacionalidade portuguesa filhos de imigrantes que vivam no país há dois anos, quem for casado ou viva em união de facto com um português há mais de três anos, membros de comunidades portuguesas no estrangeiro, quem foi adotado por um português, filhos ou netos de portugueses.