Produção hospitalar teve quebras até 18% no ano passado. Nos centros de saúde, contactos telefónicos compensam perda de 7,9 milhões de consultas presenciais. Rastreios oncológicos também em queda.
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Tomado de assalto pela covid, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) assistiu, no ano passado, a quebras de produção exponenciais. O ritmo das vagas pandémicas, pôs travão a fundo nas consultas, cirurgias e urgências nos meses de abril e dezembro. Com oscilações regionais: no Norte, responsável pela maior produção hospitalar, registou-se a menor quebra. Tudo somado, a pandemia retirou ao SNS milhões de consultas e milhares de cirurgias, urgências e rastreios.
Numa análise à produção hospitalar, 2020 fecha com uma quebra na atividade cirúrgica de 18%. Foram menos 127 mil, com o decréscimo maior a verificar-se na atividade programada (-19%), a que não é alheia a orientação da tutela, no pico das 1.ª e 2.ª vagas, para suspender a atividade não urgente. No total, realizaram-se 577 mil cirurgias, 250 mil das quais na Região de Saúde do Norte. Que registou a menor quebra (-15%), enquanto Centro e Algarve caíram 23%.
Relativamente às consultas médicas hospitalares, o maior decréscimo verificou-se nas primeiras consultas (-16%). Somando as subsequentes, os hospitais realizaram, no ano passado, menos 1,3 milhões de consultas. Numa quebra de 11% face ao ano transato, com um total de 11,1 milhões de consultas.
Presenciais caem a pique
O problema há muito foi identificado tanto por administradores hospitalares como por médicos. Os hospitais não estão a receber referenciações dos Cuidados de Saúde Primários, impactando nas primeiras consultas e, consequentemente, nas cirurgias. Absorvidos pela covid e pelos contactos diários a infetados, aos médicos de família falta tempo para acompanhar as listas de utentes.
No ano passado, o balanço final fecha positivo, com um aumento de 5% nas consultas realizadas. Mas por força, exclusiva, das consultas por telefone, que os médicos entendem não ser um ato clínico. Face a 2019, duplicaram para um total de 18,5 milhões de consultas não presenciais.
Questionada ontem no Parlamento se as não presenciais incluíam "trace-covid", a ministra da Saúde limitou-se a dizer: "Confio nos clínicos e naquilo que eles classificam". O certo é que as orientações são para marcar esses atendimentos como consulta covid-19 não presencial.
Já no que às consultas presenciais concerne, realizaram-se menos 7,9 milhões, uma quebra de 38%. Também os domicílios baixaram (-37%). Se somarmos a quebra de consultas presenciais de hospitais e centros de saúde, 2020 fecha com menos 10 milhões de consultas.
-170 mil mamografias
Em suspenso estiveram também os rastreios oncológicos, retomados depois em junho. De acordo com os dados do Portal da Transparência do SNS, no final do ano passado havia menos 170 mil mulheres com registo de mamografia nos últimos dois anos. Contando-se ainda menos 125 mil utentes com rastreio ao cancro do cólon e reto. De referir, ainda, menos 141 mil mulheres com papanicolau atualizado, exame fundamental na prevenção do cancro do colo do útero.
Há muito que a Sociedade Portuguesa de Oncologia e a Liga Portuguesa Contra o Cancro alertaram que a doença oncológica não espera. A pandemia terá provocado uma quebra de 60% a 80% nos novos diagnósticos, uma estimativa de mil cancros por identificar em 2020.
Urgências afundam
Curva idêntica registou-se nos serviços de Urgência. Com dezembro a ter uma quebra na procura de 65%, a mais alta de todo o ano. A segunda maior descida tinha acontecido em abril, com a procura a cair para metade. 2020 termina, então, com menos 1,975 milhões de idas às urgências.
Numa análise às prioridades de atendimento, verifica-se que 47% dos episódios não eram urgentes, menos um ponto percentual do que em 2019.