Marcelo usa "bomba atómica" se situação "patológica" paralisar governação e recusa "panorama desgraçado" no PRR. Propõe recuperação faseada do tempo de serviço para os professores.
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Marcelo Rebelo de Sousa avisou o Governo que não deixará de recorrer à "bomba atómica" e dissolverá a Assembleia da República se sentir que "alguma coisa patológica" está a tornar "impossível" a governação, apesar de considerar que o PSD representa "uma alternativa fraca". Na situação limite que o faria optar por esta solução, inclui um "panorama desgraçado" na execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
"Mantenho o princípio de manter a legislatura até ao fim, mas não me peçam para renunciar ao poder de dissolver. Isso não renuncio", garantiu o presidente da República, numa entrevista à RTP1, quando falava da TAP e dos sucessivos casos que atingem uma maioria absoluta que "nasceu requentada e cansada".
Porém, "se sentir que há alguma coisa patológica, excecional, do normal funcionamento das instituições, que ganhe uma tal dimensão que paralise a existência do Orçamento, torne impossível a governação, aí pondero isso", avisou.
Alternativa é aritmética
"Habituei-me a nunca dizer nunca", destacou, na entrevista que assinalou sete anos na Presidência, dando o exemplo de uma situação limite. Se 2023 terminar com "um panorama desgraçado do ponto de vista da execução do PRR" e "da situação económica e social do país (...), teria de repensar a realidade". Mas não crê que "haja razões para isso".
Marcelo está pessimista quando à situação económica do país, vendo o "copo meio vazio", e avisa mesmo que poderá ser preciso reforçar os apoios sociais.
Nos seus juízos sobre o Governo, destacou como fator determinante a existência de alternativa. "Para ser forte, tem de ter um partido liderante de um hemisfério claramente mais forte do que os outros. O PS, mesmo com as formas originais dos governos anteriores, era muito mais forte do que os demais", recordou. Já o PSD tem "acima do somatório dos outros dois mas não o dobro. E isso dá uma alternativa fraca na liderança", disse Marcelo. A seu ver, a alternativa de Direita só existe "aritmeticamente" porque, apesar da maioria em sondagens, "a IL recusa entender-se com o Chega".
"TAP marcou Governo"
Sobre a TAP, diz ser "uma ilusão" pensar que não há efeitos políticos, porque "isto marcou o Governo". "É como uma TAC, deixa radiações irreversíveis no corpo". Admitiu ainda que o ministro das Finanças tenha "responsabilidades políticas" a retirar de toda a situação que envolve Alexandra Reis. E aconselhou Medina a "olhar para trás e ver tudo o que foi o passado".
"Incomoda muito os portugueses a ligeireza como neste e em muitos outros casos houve a escolha de governantes. Não havia questionário mental exigente", atirou, mas Costa "tem de ter noção que vai ser alvo de escrutínio rigorosíssimo".
Marcelo fez também duras críticas à Igreja devido aos abusos sexuais, sendo "óbvio" que os denunciados deveriam ser afastados.
Sobre a greve dos professores, avisou que ainda têm apoio dos pais "mas, à medida que a luta evolui, apesar de manterem unidade", haverá "tratamento discriminatório entre alunos". Quer um acordo que inclua a recuperação do tempo de serviço, embora "não seja possível a recuperação integral neste momento". Mas "porque não fasear a recuperação?", sugeriu.
Sobre o pacote de medidas para a habitação, Marcelo avisa agora que "é fundamental saber se as propostas são concretizáveis".
Momentos-chave de sete anos de mandato
Presidente de afetos
Em 2016, antes de tomar posse, Marcelo rompeu com o estilo de Cavaco, anunciando que seria um presidente de "afetos, proximidade, simplicidade e estabilidade".
Costa "irritante"
No mesmo ano, falou do "otimismo crónico e, às vezes, ligeiramente irritante" de António Costa.</p>
Distante de Rio
Em vésperas de eleições no PSD, recebeu Paulo Rangel em Belém. Rui Rio, o líder, não gostou. Mais tarde, Marcelo lamentou que os líderes de Direita tenham "descolado ostensivamente" dele.
Pedrógão e Tancos
Após os incêndios de Pedrógão, forçou, com sucesso, a demissão da ministra da Administração Interna. Sobre a encenação da recuperação das armas de Tancos, negou ter sido informado: "O presidente não é criminoso".
Chega nos Açores
Em 2020, nos Açores, houve geringonça de Direita, que incluiu o Chega. Marcelo deu posse ao Governo, mas avisou que a solução não era "ideal".
Abusos na Igreja
Afirmou que 400 casos de abusos sexuais na Igreja não eram um número "particularmente elevado". Dois dias depois, acabou a pedir desculpa.
2023 é "decisivo"
Na mensagem de Ano Novo, pediu "estabilidade" e avisou o Governo de que 2023 é "decisivo".