Entre janeiro e abril deste ano, um em cada quatro subsídios de educação especial foi cortado pela Segurança Social (SS). Foram feitos menos 45 mil pagamentos de apoios de bonificação por deficiência, no mesmo período, enquanto o abono de família continua na trajetória descendente e o número de beneficiários nunca foi tão baixo. As famílias e os terapeutas das crianças em risco pela falta de tratamentos estão a organizar um protesto no próximo dia 27 de junho, às 10.30 horas, em frente ao centro de verificação de incapacidades da SS, em Valadares (Gaia).
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Nos primeiros quatro meses deste ano, a SS pagou menos 5264 subsídios de educação especial face a igual período do ano passado, o que equivale à eliminação de um em cada quatro apoios pagos a crianças que, por sofrerem de uma deficiência, necessitam de frequentar ensino especial ou ser acompanhadas com terapias, normalmente efetuadas no privado e pagas contra reembolso aos pais. O total destes apoios no quadrimestre foi o mais baixo desde 2015, altura em que Pedro Passos Coelho prosseguia a política de cortes da troika.
A bater Mínimos
A bonificação por deficiência, paga pela SS a menores de 12 anos também sofreu um corte de quase 12%, o que equivale a menos 45 378 crianças apoiadas, numa altura em que o abono de família chega a cada vez menos titulares. Em abril, foram pagos apenas 1,04 milhões de abonos (-4,1% do que no homólogo de 2021). Até abril, o total de bonificações por deficiência foi o mais baixo desde 2017. O total de abonos nunca foi tão baixo nos últimos 12 anos.
"Estamos a deparar-nos com indeferimentos em massa de subsídios a crianças com problemas gravíssimos, desde autismo, fenda do palato, perturbações da linguagem, hiperatividade, com toma de medicação diária, sem qualquer justificação por parte das equipas de verificação", denunciou a responsável de uma clínica especializada no apoio a estas crianças, preocupada com a "interrupção de tratamentos que os pais não podem pagar e a que o Serviço Nacional de Saúde não dá resposta".
As famílias temem que, além da regressão dos tratamentos em crianças que começavam a ter resultados positivos, a paragem das terapias possa ser irreversível, uma vez que "alguns problemas, como da fala e da linguagem, têm de ser resolvidos no início da idade escolar, sob pena de a criança nunca mais recuperar atrasos na leitura e na escrita, que vão prejudicá-la para a vida".
Após dois anos de confinamentos intermitentes - que prejudicaram especialmente os mais pequenos, que tiveram aulas sem ir à escola, não desenvolveram competências sociais e que estiveram, inclusive, por diagnosticar -, o corte dos apoios em terapias como psicologia, terapia da fala, terapia ocupacional ou outras "é uma enorme injustiça, especialmente da forma como tem sido feito". Melina Marques é mãe de três crianças (ler ao lado) e assegura que, "em cinco minutos, a junta de verificação indeferiu os apoios, mesmo reconhecendo a deficiência".
perturbações a aumentar
Nas escolas, há "cada vez mais crianças com perturbações de aprendizagem ou de comportamento", relata Virgínia Castro, professora de educação especial (ler ao lado).
Ao JN, fonte do Instituto da Segurança Social respondeu que o processo de atribuição deste apoio não se alterou desde 2016, nem existem "quaisquer instruções para reduzir a sua atribuição". No presente ano letivo, acrescentou, entraram 31 456 requerimentos e "há menos processos indeferidos que no ano passado". A mesma fonte não justificou o procedimento das juntas de verificação que dispensam relatórios médicos a recomendar terapias.
Pormenores
Menos 13 mil - A bonificação por deficiência abrangeu 84 535 pessoas, em abril deste ano, o que representa quase menos 13 mil pessoas face a abril do ano passado. Em abril de 2020, eram cerca de 104 mil, o que significa que também este apoio tem sofrido grandes cortes.
Lentidão - Quando usado para custear terapias, o subsídio de educação especial só é pago contra reembolso, após os pais terem suportado o custo e enviado o recibo para a Segurança Social. Além de demorar meses (há relatos de mais de meio ano) a receber, os pais queixam-se de haver pedidos de devolução de apoios de há um ano.