Na guitarra, o cantor e compositor vê a adolescência, os primeiros acordes, as dúvidas e cicatrizes.
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"Há objetos que ultrapassam a função para a qual foram criados. A guitarra, por exemplo, não é só um instrumento. É memória, é corpo, é viagem. Quando pego nela, não estou apenas a fazer música: estou a abrir uma porta para lugares que só existem quando o som se solta das cordas. Quando olho para a Fender Stratocaster que me acompanha desde o início da minha viagem a fazer álbuns, sinto uma gratidão gigantesca. Por saber que ali tenho um escape. Esta sempre me acompanhou como uma extensão das mãos, assim como a Ibanez, de jazz - às vezes como refúgio, outras como companhia. Já passou noites inteiras comigo, quando o silêncio era demasiado pesado. Já atravessou palcos grandes e pequenos, já ouviu segredos que nunca chegaram a ser canções. É o objeto que mais me define. Se alguém quisesse perceber quem sou, bastava sentar-se ao meu lado enquanto a toco.
Nela está a minha adolescência, os primeiros acordes mal feitos, a curiosidade de descobrir sons, as primeiras melodias e letras - as curas para os traumas e também as minhas dúvidas e cicatrizes. Quando olho para a minha guitarra, lembro-me sempre que a vida é isto: seis cordas que se repetem, mas que nunca soam exatamente da mesma forma. E vejo-a como vejo a vida - uma eterna repetição, mas que é sempre infinitamente diferente.
E é nesse intervalo entre a repetição e a surpresa que me encontro."
Janeiro
Cantor, compositor, multi-instrumentista, produtor
31 anos