Corpo do artigo
“O ouro é nosso”. Este foi o comentário que o primeiro-ministro português destacou logo após Iúri Leitão e Rui Oliveira terem conquistado a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Paris. Foi numa vertente do ciclismo de pista, Madison, que a maioria dos portugueses, incluindo Luís Montenegro, desconhecia por completo como funciona até à vitória que fez soar o hino nacional em França.
Posando para a fotografia ao lado dos vencedores, Montenegro disse que “com garra e determinação os nossos sonhos concretizam-se”. Também Marcelo Rebelo de Sousa veio realçar que a conquista foi “alicerçada num espírito vencedor e extraordinários méritos desportivos”. Nada do que foi escrito é incorreto e muito menos se deve apagar o talento e esforço dos dois atletas, os primeiros a garantir uma medalha de ouro para Portugal que não deriva de provas de atletismo.
A questão centra-se mais no facto de poucos saberem como foi trilhado o caminho de Iúri e Rui até ao êxito. Com o megafone do êxito, foi tempo de revelação. Muitos descobriram que Portugal inaugurou em 2009 um centro de alto rendimento de ciclismo, nas suas variadas modalidades incluindo a pista. Este velódromo foi apenas um dos instrumentos para o sucesso, além dos atletas, treinadores, dirigentes e outros entusiastas que são a fonte para progredir e obter resultados.
A ambição de estar entre os vencedores é legítima e mesmo necessária. Aguça o espírito e motiva. Dispensável é que se faça girar o nosso o mundo em torno de sermos os melhores, os maiores. O presidente da República, hoje mais resguardado, já foi um dos principais instigadores desta ânsia pela glória, típica de um povo saudosista. Tudo pela fama, pelo trono.
Só que para ali chegar é um caminho que é preciso definir, construir e percorrer. É aqui que se deve centrar o entusiasmo. Em criar as condições para que os atletas, os cientistas, os artistas e muitos outros sejam muito bons naquilo que fazem. Se o forem, as distinções acabam por surgir, como já temos vários exemplos, com Iúri e Rui a serem os mais recentes, mesmo numa modalidade com escassa tradição em Portugal. Mas sem impor a pressão da vitória, como se viu na prova de Madison onde poucos esperavam o topo para os dois portugueses.
As selfies e frases bonitas são uma consequência, não são um motor do sucesso. É na carburação, que exige anos de trabalho e dedicação, que se abrem as vias de triunfo. E este objetivo nem sempre exige que se seja o melhor dos melhores nem o maior dos maiores.