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Os tempos de bonança que o futebol português viveu nos últimos meses parece terem chegado ao fim por força dos acontecimentos mais recentes. A morte de Pinto da Costa provocou um manto de silêncio no Benfica e no Sporting, defendidos pelo escudo da hipocrisia, que dá sempre jeito. Mas quando a covid-19 abalou a indústria e ameaçou as finanças dos clubes, aí os três grandes tomaram uma posição coletiva e sentaram-se à mesa com o Governo, sem qualquer hipocrisia na hora de defender o negócio.
No sábado, o F. C. Porto soltou as amarras e apelidou Frederico Varandas de "santo", com a mesma ironia que caracterizou Pinto da Costa durante 42 anos. O presidente do Sporting gosta de dar uma imagem de urbanidade, mas vir criticar a arbitragem quando o campeonato entra na fase decisiva é usar a mesma tática dos velhos dirigentes e mostra como todos os trunfos contam na luta pelo título. Além de poder criar pressão, também funciona como uma boa cortina de fumo, até porque a equipa tem os rivais à perna e está longe de praticar o futebol champanhe do início de época.
A clivagem entre Villas-Boas e Varandas mostra como o futebol português está fragilizado, por muito que se passe uma imagem de união e coesão, desde o topo da pirâmide até à base. Na última assembleia geral da Liga, a falta de consenso entre os clubes para que se marcasse a data das eleições à liderança do organismo refletiu uma preocupante falta de solidez, quando os próximos tempos são muito importantes. Sem sintonia será difícil discutir como a centralização dos direitos televisivos vai passar da teoria à prática, na criação de um modelo de distribuição que possa agradar a todos. Esse acordo é a pedra de toque do equilíbrio e da competitividade tão vitais e há muito reclamados pelos agentes.
Aliás, a centralização será um bom teste para se perceber a solidariedade entre os clubes grandes e pequenos e também a perspicácia do futuro presidente da Liga e do mais recente eleito líder da Federação Portuguesa de Futebol. "Unir o futebol" foi o mote da candidatura de Pedro Proença, que tem a tarefa de colar todos os cacos para atingir a pacificação a que se propôs. Será neste ambiente pouco sereno, por vezes audível, outras vezes silencioso, que Proença terá de cumprir uma das suas promessas eleitorais. E a fasquia está demasiado alta.