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Um conflito, aparentemente, sem fim à vista. Sindicatos dos médicos e Ministério da Saúde fazem reunião atrás de reunião, sem que daí alguma conclusão resulte. Continuam em campos opostos e as dificuldades de aproximação mantêm-se. Bem vistas as coisas, no entanto, parece haver apenas uma questão a separá-los: salários. Que os médicos são mal remunerados parece ser consensual, como também é verdade que os portugueses no geral o são. E não parece ser bom argumento recorrer a rankings europeus a demonstrar que os profissionais de saúde portugueses surgem como dos mais mal pagos da União Europeia, isso só funciona se abstrairmos do rendimento geral dos países.
Pedir um aumento salarial de 30% pode ser olhado com seriedade se houver abertura de negociação. Que condições possui o ministro Manuel Pizarro para responder afirmativamente a tal reivindicação? Muito poucas. Abriria, sem dúvida, a caixa de Pandora: seria mais que legítimo vermos as restantes classes profissionais sair à rua, a paralisar o país em luta por semelhantes condições. Puro engano. Nenhuma encerra o poder da classe médica e é fácil de perceber porquê. Não há profissão tão intrinsecamente ligada à vida, nenhuma faz desta maneira a diferença entre a vida e morte. E é precisamente esta particularidade que devia fazer refletir os médicos.
Não deixa de ser assustador ver aqueles que nos habituámos a olhar como cuidadores deixando no ar a ameaça: se o Governo não cede, vidas podem ser perdidas por falta de atendimento. Ao mesmo tempo, assistimos a anúncios em catadupa de fecho de serviços nos hospitais.
Chantagem, não há outra palavra para descrever o espetáculo a que estamos a assistir. Exigir melhores condições de trabalho, sim, obviamente. Com ética, sempre. E os médicos não o devem esquecer, em momento algum.