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Afinal de que é feito o espírito de Natal? Quando éramos crianças, a felicidade passava por ter aquilo que seria inatingível em outras alturas do ano e vinha dentro de uma caixa embrulhada em papel colorido e com um grande laço. Havia a expectativa e o sonho de imaginar o que estaria ali dentro, se todos os nossos desejos se resumiam àquele pedaço que tínhamos nas mãos. No tempo dos nossos avós era mais do que isso. Quando imperava a escassez de recursos durante as amarguras do Estado Novo, era no Natal que as famílias menos abastadas conseguiam degustar uma série de iguarias inatingíveis em outras épocas do ano.
Agora, a velocidade do tempo leva-nos a ter uma perceção diferente. Os preços disparam, os salários até podem ser mais pequenos, as prestações das casas enormes, a vida é cada vez mais difícil, nós sabemos, mas poucas famílias esperam pela altura do Natal para presentear as crianças com os melhores mimos.
A tentação pelo consumismo é tanta que ao longo dos meses somos inundados por promoções fúteis nas lojas mais absurdas dos centros comerciais.
Chegam os dias sem IVA, as famosas "black fridays", os descontos por tudo e por nada e muitos são levados pela corrente de comprar as coisas mais desnecessárias, só porque a tentação materialista é tão ou mais poderosa do que a nossa razão.
Talvez agora as crianças não olhem para o Natal como aquela época do ano em que teriam as sapatilhas que mais desejam ou o carro telecomandado igual ao do vizinho, ou até o jogo mais caro da consola eletrónica, muitas até já sabem que o Pai Natal é um mito criado pela imaginação de alguém e que não chega num trenó carregado de prendas e com um sorriso a rasgar as barbas brancas. Nem sequer vive na Lapónia, naquele sítio que só parece existir nos contos de fadas.
Os tempos são outros, os anos até podem passar a correr e moldar a nossa forma de ver o Mundo, mas há raízes importantes e inquebráveis que mostram como esta época é especial. Porque é nesta altura que nos lembramos dos amigos, das amizades que o tempo às vezes teima em afastar, que nos preocupamos mais com os outros e há algo que o materialismo é incapaz de roubar: a garantia que o Natal é a festa onde a família se reúne e se envolve em laços de solidariedade e harmonia. Esse é o verdadeiro espírito de Natal, sabermos que estamos juntos.
*Jornalista