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O "Terra Madre - Salone del Gusto", um evento bienal, em Turim, regressou este ano após uma interrupção devido à covid-19. Este evento internacional "Slow Food" foi muito importante pelas mensagens que trouxe. São três os pontos-chave: a biodiversidade é preservada através da agricultura tradicional e da recuperação daquelas frutas, hortaliças e produtos até aqui esquecidos; os alimentos e a cadeia de abastecimento são elementos fundamentais para o combate às alterações climáticas, tanto reduzindo desperdícios (um terço dos alimentos acaba no lixo durante o seu ciclo de vida) como produzindo de forma sustentável; a proteção da cultura local, a história dos lugares e a paisagem passam pela cultura da comida "Buona Pulita e Giusta", que significa boa, saudável e sustentável e justa.
Uma ulterior mensagem fundamental transmitida é que compartilhar conversas, alimentos e tradições é uma das bases para uma paz duradoura e para a fraternidade dos povos, através do entendimento mútuo das respetivas culturas.
O "Slow Food" nasceu na Itália, inicialmente com o nome de "Arci Gola", em Bra, na região do Piemonte; fundada por Carlo Petrini, em 1986, tornou-se uma associação internacional em 1989. Petrini, gastrónomo e sociólogo, tinha como a ideia central preservar e valorizar os produtos agrícolas locais e a sua qualidade, com uma atenção crescente aos produtos e aos produtores, em Itália e no Mundo, em nome da biodiversidade.
A importância do projeto foi tamanha que o jornal britânico "The Guardian" incluiu Petrini na lista das 50 pessoas que podem salvar o nosso planeta.
A sua filosofia resume-se no lema da organização: "Buono, Pulito e Giusto". Esses três adjetivos são a base da verdadeira qualidade dos alimentos e referem-se à possibilidade de produzir e consumir um alimento que seja:
Atento às qualidades organoléticas do produto e conscientes da relatividade cultural do conceito de "bom", respeitando as práticas de produção que não alteram a natureza do produto;
Produzido de forma eco-sustentável, através de uma agricultura que respeita o território e o próprio produto. Todas as etapas de produção, comercialização e até consumo devem respeitar o bem-estar do produtor, do
consumidor e do meio ambiente;
Respeitando a ética e a equidade social, tanto na fase de produção quanto na comercialização. Um alimento justo é aquele produzido e comercializado respeitando os direitos humanos e através de trabalho capaz de proporcionar gratificação a quem o produz.
O "Slow Food" acredita que é importante recuperar plenamente a dimensão do prazer de comer. Por isso, é fundamental sensibilizar o consumidor para escolhas alimentares mais informadas, estimulando essa consciência com educação alimentar desde a infância; por outro lado, é também necessário promover práticas de produção amigas do ambiente, recuperando também as técnicas tradicionais de processamento de alimentos.
Em 2003, o "Slow Food" criou a organização sem fins lucrativos "Slow Food Foundation", que promove projetos para a difusão de um modelo de agricultura baseado no respeito pela biodiversidade, pelo território e a cultura local. A Fundação, portanto, estabelece o objetivo de promover o acesso a alimentos bons, saudáveis e justos em todo o Mundo e em todas as comunidades.
À medida que o movimento cresceu, os princípios da filosofia "Slow Food" espalharam-se pelo mundo, levando o "Slow Food" a mais de 70 países, incluído Portugal, onde a associação de Petrini conta com dois projetos: as fortalezas do "Slow Food" e o projeto "Arca do Gosto", que tratam de mapear, apoiar e proteger produtos e receitas em risco de extinção.
Em Portugal a Arca do Gosto tem 34 produtos. Para produtores, restaurantes e lojas, estes são um primeiro passo para a proteção mundial da biodiversidade.
Temos vindo a seguir vários projetos em que as comunidades "Slow Food", além de trazerem riquezas para áreas aparentemente marginais, têm contribuído para a gestão do território, para a redução de riscos e para a sociedade. Um excelente exemplo é a cebola chata de Pedaso, em Marche (Itália), tem um resíduo com o qual, a lã (de uma espécie de ovelha chamada Sopravissana protegida pela biodiversidade zootécnica) pode ser colorida de um belo verde. O desenvolvimento local da indústria leva à proteção das dunas costeiras (onde se cultiva a cebola) e à criação de uma indústria circular que tinge sem poluir.
*Doutor em Ciências Ambientais e professor externo de Sistemas Ambientais e Biomimética na Universidade IUAV de Veneza