"Uma grande desgraça assolou o Porto", lia-se na primeira página do JN do dia 30 de agosto de 1907. O longo e descritivo relato destaca a "crueldade feroz da sorte". No dia em que se realizou o primeiro concurso para distribuir prémios aos leitores do jornal, desabou o chão do salão onde decorria o sorteio, com uma multidão lá dentro. Dez pessoas morreram, entre as quais José d"Araújo Braga, um menino de 13 anos. Dezenas ficaram feridas, incluindo trabalhadores do JN.
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À porta do salão, na Rua de D. Pedro, no Porto, onde estava o JN instalado, ouvia-se "o ruído abafado da multidão que se comprimia". O sorteio estava marcado para o meio-dia e a polícia, "postada às portas obedecendo às ordens formais" do jornal, "impedia a entrada". Metade da sala estava reservada ao público, mas a multidão à porta era cada vez maior.
"Começou a girar a enorme esfera [com as 6072 cartas apuradas para o sorteio], que era vista pelos numerosos populares agrupados na Rua de D. Pedro. Estes, irrompendo de roldão, venceram os esforços da polícia e penetraram à força na sala", relata o JN. E foi nesse "mesmo instante" que se ouviu "um estalo formidável". "Quem escreve estas linhas sentiu fugir-lhe o chão", continua o relato.
"Havíamos dado ordens severas aos seis guardas que tínhamos na sala e no corredor de entrada para não deixar entrar mais ninguém, depois que estivesse cheia a parte da sala destinada ao público. E assim, no corredor de entrada do nosso jornal da Rua do D. Pedro, encontrava-se grande multidão", escreve-se naquela edição do JN. A cena que se seguiu foi "apavorante".
"Alucinados com a vista de tal desgraça, corremos todos às janelas a pedir socorro, chamando logo os bombeiros e todos os auxílios. Tivemos então o espetáculo da maior generosidade e da mais absoluta dedicação de que se pode ser testemunha", agradece o jornal ao "generoso povo do Porto".
Depois de retirados todos os feridos e esvaziado o salão, os bombeiros começaram com os trabalhos de remoção dos escombros. "E, então, todos os nossos corações se confrangeram ao ver subir alguns mortos, que eram levados em macas e em carruagens", lamenta o jornal, que escreveu o nome de todos os feridos, daqueles que tinham passado a noite na enfermaria, mas também daqueles que tinham regressado a casa no próprio dia após ida ao hospital. Das dez vítimas, "sete foram já retiradas sem vida". "Os outros três chegaram a dar entrada em algumas das enfermarias do hospital, mas faleceram horas depois", diz o diário, agradecendo a "todos os que nos trouxeram o conforto da sua participação na nossa enorme dor".