Os socalcos e o dia a dia da gente que vive na pequena aldeia encantam os turistas, que não se cansam de tirar fotografias e enchem praças e ruelas. A população, que tenta viver o mais pacatamente possível, é que não acha muita graça à "invasão" e não gosta das objetivas das câmaras.
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Na história de Sistelo, em Arcos de Valdevez, há um antes e um depois, marcado por três acontecimentos: a chegada da ecovia do Vez, a classificação da paisagem dos socalcos como monumento nacional (2016) e a vitória do concurso "7 maravilhas de Portugal- Aldeias" (2017).
A localidade serrana, com cerca de 300 habitantes, foi invadida por turistas. E, em dois anos, deu uma reviravolta: todas as 14 casas devolutas no centro da freguesia foram compradas (11) por investidores ou recuperadas pelos proprietários (3) para criar alojamento turístico. A antiga e única taberna foi modernizada e ampliada pelos netos da proprietária e a adega da antiga casa paroquial transformada em restaurante por dois casais filhos da terra, ex-emigrantes em França.
Animação ganha pujança
O negócio da animação turística ganhou pujança. Um empresário local pôs a circular um autocarro panorâmico, ligando a aldeia à vila de Arcos de Valdevez e promovendo visitas de grupos. Há também vários investimentos públicos em curso. No geral, a "nova vida" de Sistelo é vista com bons olhos, mas alguma população que preza a antiga quietude ressente-se. Uma habitante que o JN questionou sobre os turistas, respondeu, virando costas: "Semelhante peste nunca vi na vida. Que vão todos com Deus!".
"Quando cheguei, em 2016, a aldeia era muito mais pacata. Havia menos gente. Agrada-me esta nova Sistelo, desde que, em primeiro lugar, se defenda, respeite e valorize as pessoas que cá estão. Às vezes, algumas sentem-se incomodadas, porque parece que quem nos visita as olha como se fossem de outro Mundo", comenta o padre Bruno Barbosa, 28 anos, testemunha dos "lamentos" das gentes locais. "Estas pessoas são daqui e de carne e osso. Têm as suas tradições. Quando os turistas veem uma vaca, é só flashes. Os habitantes não gostam, sentem-se invadidos". É "um aspeto menos bom", ressalta o pároco, num contexto de mudança positiva.
A igreja e o castelo da aldeia estão a ser restaurados. Neste último, será criado um centro de promoção e sensibilização ambiental da paisagem cultural, com área de exposição e loja e sala de degustação de produtos locais. Em breve, abrirá uma outra loja de recordações e mercearia. Vão ser recuperadas eiras de espigueiros, beneficiados miradouros e prolongada a ecovia em 2020.
A Junta de Freguesia viu-se obrigada a uma nova dinâmica e a investir para criar condições de acolhimento. O autarca Sérgio Rodrigues evidencia que "o boom de Sistelo se deve essencialmente às "7 maravilhas", mas à ecovia também. O contador dos passadiços registou cerca de 80 mil pessoas num ano. No dia com maior afluência passaram mais de 1000". E, quanto à invasão turística, refere que "Sistelo é exemplo para o país de como combater a desertificação". Mas comenta: "Tenho saudades do tempo de abrir a Junta só ao domingo de manhã e de ter pouco que fazer. Sou quase um guia turístico".