Mosteiro de S. João d'Arga recebe hoje festa popular, animada pelas concertinas e pelo chiripiti.
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Um grupo de 12 homens e respetivas mulheres e filhos, vindos de Viana e que dá pelo nome de "Rusga perdidos da noite", está acampado, desde domingo, nas imediações do mosteiro de S. João d'Arga, no alto da serra, em Caminha. O lugar estava marcado há um mês para garantir a estadia na romaria, cuja noite maior se vive hoje.
Durante o dia milhares vão subir a serra, a pé e de carro, para se divertirem até altas horas, no adro do mosteiro, ao som de concertinas, cantares de quadras típicas (mais ou menos picantes) e despique desenfreado de duas bandas de música. E quem sabe perderem-se na noite, inebriados pelo espírito folião, a que dão vigor a música, o vinho, a cerveja e o chiripiti, bebida feita com aguardente e mel pelas gentes serranas.
É assim a Romaria de S. João d'Arga, que tem a sua génese no culto religioso ao santo, mas cuja "má fama" vem de longe e a tornou, até os dias de hoje, destino de folguedo profano.
"Já vimos há seis anos e antes um mês marcámos lugar com umas estacas, porque senão não há sítio para montar as tendas. Tem de ser mesmo assim. Há quem se perca na noite por causa da aguardente com mel", brincava, ontem, António Carvalhido, chefe do grupo "Perdidos da noite", já de concertina ao peito a animar o pessoal.
48 anos a subir a serra
Desidério Afonso, economista de 62 anos, natural de Dem, Caminha, ensaiador de folclore, sobe a serra desde os 14 anos.
É um apaixonado pela romaria e conhece como ninguém a parte profana. "S. João d'Arga é: apalpa aqui, beija acolá. Sempre foi assim e ainda hoje o é", descreve, atirando uma quadra para demonstrar a malandrice do próprio padroeiro da festa. "O meu Senhor S. João d'Arga é um santo velhaco, foi à fonte levou três, de regresso já vinham quatro [uma já vinha grávida]"".
E recorda: "Quando comecei a vir no anos 70 era o único da minha freguesia. As aldeias ao redor do Mosteiro de S. João d"Arga não aderiam, porque a romaria tinha má fama, ligada ao sexo. Não havia eletricidade, só candeeiros a azeite, petróleo e velas. Não se podia sair do adro. E os pais não deixavam a juventude vir, principalmente as filhas".
Homem de folclore, que privou e partilhou noites de romaria com Pedro Homem de Melo, Desidério Afonso comenta que "não há preconceito" no que se canta serra acima e noite dentro no recinto.
"Temos quadras terríveis. E atira: "O lugar de Castanheira [na serra d'Arga], com leirinhas ao correr, no meio de tantas cabras, alguns cornos tem de haver".
Após a folia, no Mosteiro de S. João d'Arga, o dia 29 é dedicado inteiramente à parte religiosa.
Casamento
Desidério Afonso protagonizou o primeiro casamento no mosteiro. De tanto gostar da romaria, jurou que ali casava. E casou. Foi a 1 de agosto de 1980.
Chiripiti
Bebida típica das aldeias da serra d'Arga para aquecer as noites frias, feita com aguardente e mel. É vendida a rodos nas tasquinhas da romaria.
Esmola ao Diabo
Uma tradição, inspirada numa lenda de origem desconhecida, manda entrar na capela de S. João d'Arga para dar esmola ao santo e... ao Diabo. Para que "nada corra mal".
Despiques
Dos momentos mais divertidos da noite são os despiques das bandas de música e os avisos, por vezes hilariantes, lançados a pedido pelos romeiros, através do altifalantes.