Embora haja muita gente, negócio que era tradição no concelho foi "chão que já deu uvas". E também há poucos interessados nas barracas de praia.
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"Está pior do que nos anos da covid: os alugueres de barracas contam-se pelos dedos e os nadadores estão a ganhar quase o dobro!", atira Maria do Alívio Bicho. Aos 60 anos, ela e o irmão têm a concessão da praia do Loulé, na marginal da Póvoa de Varzim. Por ali, as barracas já não enchem barriga. Ali a dois passos, na Rua Latino Coelho, Alzira Regufe, aluga quartos a banhistas desde que é gente.
O negócio, que noutros tempos dava de comer a centenas de famílias, já não é o que era. As famílias de Famalicão, Santo Tirso, Guimarães, Braga ou Paços de Ferreira que enchiam a cidade, agora vêm e vão. Das dezenas de alojamentos naquela rua, paralela à praia, restam agora "meia dúzia". A cidade está cheia, mas só durante o dia.
Na Latino Coelho, a casa de Sofia Ferreira enchia-se de banhistas no verão. Toca o negócio com a mãe, de 84 anos, mas, ali, o aluguer de quartos foi "chão que já deu uvas". "A coisa está tão má que este ano nem abrimos", explica. Em julho, o S. Pedro até deu uma ajuda e o tempo esteve bom, mas "faltou procura". Em agosto, com os emigrantes, "a coisa melhora uma bocadinho, mas pouco". Impostos para pagar, manutenção, "trabalhos", "não se ganha para as despesas", frisa. Sofia já estava habituada à casa cheia. Confessa que tem "saudades" do movimento, ela que nasceu ali entre os banhistas que lhe invadiam a casa no verão.
"As pessoas vinham, alugavam ao mês e à quinzena. Agora só vêm os velhos, mas vão morrendo e isto acaba. Os mais novos não ficam ou, quando ficam, é um ou dois dias", conta, lamentando a falta de atrativos na cidade, sobretudo à noite: "Não se vê ninguém".
Queixas na praia
"Isto cada vez está pior! Até as excursões deixaram de vir para aqui. O estacionamento é a pagar, aos fins de semana cortam a estrada [Avenida dos Banhos] e as pessoas fogem", continua a contar Maria do Alívio, apontando as barracas vazias na praia do Loulé. Os tempos dos alugueres "certinhos, ao mês", das famílias do interior que vinham a banhos à Póvoa, já lá vão. Os mais novos, queixa-se, não alugam barraca (exceção para uma ou outra família com bebés) e as autoestradas facilitaram as deslocações. "Muitos vêm à praia e vão embora ao fim do dia", constata.
"Antigamente as pessoas deixavam a barraca alugada de um ano para o outro e havia lista de espera. Agora? Contam-se pelos dedos os alugueres. A minha mãe, que já morreu há 29 anos, alugava a mil escudos (cinco euros). Hoje, as pessoas querem os mesmos mil escudos", queixa-se.
A subir, diz, só mesmo o salário dos nadadores: "Em junho, entre os dias 10 e 30, paguei 1138 euros e sempre a chover! Estamos a pagar quase 1900 euros por mês ao nadador. Não dá!", reclama, lamentando que, ali mesmo ao lado, os outros bares instalados no areal - como o Enseada, o Guarda-Sol ou o Ferrari -, que "também vivem dos banhistas", não sejam obrigados a colaborar no pagamento do nadador-salvador.
Receio
PS teme que taxa turística agrave a situação
São cerca de 300 alojamentos locais, muitos a viver do verão e do aluguer a banhistas. As contas são do PS, que acredita que a nova taxa turística de 1,50 euros por pessoa por noite só vai prejudicar ainda mais o já muito frágil negócio tradicional poveiro. A maioria PSD prevê uma receita de 200 a 250 mil euros/ano e garante que será aplicada "na animação cultural e turística e na recuperação do património". O regulamento da nova taxa está em discussão pública por 30 dias. A taxa entrará em vigor no início de 2023. O mar poveiro de águas ricas em iodo ganhou fama entre os monges beneditinos no século XVIII. No século XX, a Póvoa era já um dos mais populares destinos de férias do norte para as classes mais abastadas do interior. Ainda hoje, no verão, o concelho enche-se de gente de Guimarães, Braga, Famalicão, Santo Tirso, Fafe e Paços de Ferreira.