As Caxinas encheram-se para ver passar os 16 andores carregados pelos pescadores da terra
É muito linda a nossa festa menina!", atira Rita Marques, sentada numa cadeira, à porta de casa, ali a dois passos da Igreja do Senhor dos Navegantes no coração das Caxinas. Aos 83 anos, filha, viúva e mãe de pescador, é devota confessa do padroeiro e não esconde o orgulho na procissão que, todos os anos, arrasta milhares.
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Vê tudo em profundo silêncio. Reza pelos que o mar levou. Pede proteção para os que lá andam. Hoje foi dia da festa maior dos homens do mar. Os barcos não saíram, os pescadores carregaram os 16 andores e a maior comunidade piscatória do país uniu-se na fé.
Enquanto espera a procissão - "a maior do país" -, Rita desfia histórias da vida das gentes do mar: a miséria, as cantilenas de outros tempos enquanto se esperava os barcos na praia, a dura faina do marido na pesca do bacalhau, os muitos que já viu o mar levar. Termina com um conformado "É a vida", respira fundo e volta à procissão, que, por ali, o dia é de festa: "Vem gente de todo o lado para ver", frisa, apontando as ruas cheiinhas.
É brio caxineiro, a decoração de flores naturais dos 16 andores, a solenidade e a fé com que seguem os 290 figurantes, que, neste dia, arrasta mais de 50 mil às Caxinas.
Por ali, o Senhor dos Navegantes é culto antigo. A procissão parou durante as obras da igreja "do barco". Foi retomada em 1988. Carlos Craveiro segue lá, ininterruptamente, ano após ano. Manda a tradição que os andores (muitos com cerca de mil quilos) sejam carregados pelas tripulações dos barcos da terra, que, com os seus donativos, pagam mais de metade da festa. Durante o ano, cada barco dá à Igreja um quarto do que recebe cada tripulante. Quem der o maior "quarto" tem a honra de carregar o Senhor dos Navegantes. Carlos nunca falhou. Este ano, o "Ajudado por Deus" levou a Senhora da Bonança. "Já foi o Sr. dos Navegantes, a Senhora de Fátima, o S. Pedro... depende se o ano corre melhor ou pior, mas há-de haver sempre um andor para mim", diz.
Os 290 figurantes são quase todos caxineiros, filhos e netos de pescadores para quem, seguir ali, é "uma honra" e "um orgulho", mesmo que sejam 2:30 a andar, num dia de sol, debaixo de roupas de veludo. Move-os a fé, que, por ali, é do tamanho do mar.