"Erosão" nasceu do projeto comunitário que envolveu 200 pessoas durante quatro anos. O elenco é todo amador.
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À porta do quase centenário Teatro-Cinema de Fafe não havia limusinas, passadeiras vermelhas, nem tão-pouco batalhões de fotógrafos. Jornalistas, eram dois. Mas a noite era deles, dos atores e atrizes que durante os últimos quatro anos estiveram envolvidos no filme "Erosão" e que na noite de sexta-feira teve a antestreia. Um filme baseado em "Terra firme", de Miguel Torga, produzido, realizado e interpretado com gente humilde, o povo de algumas associações locais do concelho de Fafe, que uniu esforços para criar esta longa-metragem. Uma ideia nascida no seio do grupo Enfim Teatro, da Sociedade de Recreio Cepanense, e que foi envolvendo cada vez mais gente, da freguesia de Cepães, mas não só.
Três meses de rodagem e quatro anos de preparação para o filme "Erosão" , baseado em "Terra firme", de Miguel Torga, foi o tempo que o grupo amador precisou para um projeto que alegrou Cepães.
Mais de 200 pessoas dirigidas por José Rui Rocha, formador na área do teatro que, numa ação dirigida ao grupo foi desafiado. "Estávamos a tentar fazer coisas diferentes, com performances distintas, e um dos rapazes do grupo lançou a ideia de fazer um filme. Foi uma ideia de uma grande ingenuidade mas eu não a deixei cair. Numa oficina de leitura, líamos texto dramático, e ao cruzarem-se com o 'Terra firme', de Torga, viram que aquele poderia ser o retrato de Cepães", explicou.
Ninguém desistiu
O tema diz muita a estas gentes. A emigração para o Brasil nos séculos XIX e XX, a ruralidade, a rudeza da vida. Entre a ideia e a execução realizaram-se conferências, ouviram-se testemunhos dos mais velhos, juntaram-se associações, sintetiza José Rui. Quase quatro anos de preparação para três meses de rodagem. "A primeira reação foi de entusiasmo e de um momento para o outro foi um balde de água fria quando tínhamos de repetir, repetir e repetir. Foi tudo muito custoso, mas ninguém desistiu e houve gente a querer juntar-se", sublinhou. Gente dos 8 aos 80, na primeira experiência cinematográfica.
Depois das duas exibições deste fim de semana, o "Erosão" deverá ser projetado em algumas freguesias de Fafe e há já conversas para que possa ser visto nas comunidades portuguesas, nomeadamente em Macau, Paris, Londres e Toronto.
Uma das personagens centrais é António, pai de um filho emigrado no Brasil, interpretado por Edgar Peixoto. Amante de teatro amador, ficou fascinado com o filme. "Houve alturas difíceis, tivemos de repetir muitas cenas para estar dentro dos parâmetros pretendidos. É uma história que apesar de retratar tempos antigos continua atual", disse ao JN.
A conterrânea Arminda Soares interpreta Guilhermina, a mulher de António. "De início levei para a brincadeira, mas o professor Rui acreditou e quando demos por nós já íamos a meio. Foi fantástico porque aos 65 anos nunca pensei que fosse participar num filme", contou. "Todos se superaram, houve desempenhos extraordinários. É um filme recomendável, ficou extraordinário e Torga não ficou mal representado", concluiu José Rui.
Na sexta-feira à noite, durante a projeção, os presentes iam sendo surpreendidos pela performance dos atores. Muitos risos, reações de agrado e, no final, a carga dramática de um desfecho inesperado. Se os Oscars fossem votados em Fafe, "Erosão" ganhava em toda a linha.
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