Um carro, com pouco combustível, um cão, Perro, e meia dúzia de pertences. É tudo o que resta a Joaquim e Irene, nomes fictícios. Segunda-feira foram despejados e não tiveram alternativa senão fazer do pequeno e apertado carro um lar. Já pediram ajuda à Câmara de Gondomar e à Segurança Social, mas até agora não tiveram resposta.
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A emoção atropela as palavras de Irene, 52 anos, que fala pelo dois. "O Joaquim já está sem emprego há algum tempo e eu perdi o meu em junho", explica, sentada na parte de trás do carro, estacionado em frente à Segurança Social de Gondomar, irrequieta e tomada pela situação. "Deixamos de pagar a renda e o senhorio executou uma ordem judicial".
Joaquim pouco fala. Consciente dos direitos de todos, não atira culpas. "O senhorio estava no seu direito", diz. As lágrimas enchem-lhe os olhos e afogam as palavras. Sai do carro para apanhar ar. Os 60 anos vividos leem-se no rosto marcado por rugas e tristeza. E Irene prossegue.
"Nunca imaginamos que isto pudesse acontecer. Não podemos achar que todas as pessoas que chegam a esta situação são pessoas que não quiseram trabalhar ou que não fizeram nada".
Sem trabalho pela idade
É formada em Marketing. Joaquim em Contabilidade. Toda a vida trabalharam na área de formação. "Trabalhei numa empresa de publicidade durante 15 anos, sempre fui tendo emprego. Somos pessoas qualificadas e com formação", insiste Irene, que só quer arranjar um emprego, seja ele qual for, para voltar a dar rumo à vida.
Para Joaquim, o processo é mais duro. "Estou há bastante tempo desempregado, mas tem tudo a ver com a idade. Ninguém me dá emprego aos 60".
Quando se viram a ficar sem solução, pediram ajuda à Segurança Social que, segundo o casal, pouco fez para apoiar e evitar a situação. Joaquim já não recebe nenhum apoio social e Irene recebe pouco mais de 200 euros de subsídio de desemprego. "O que é que podemos pagar com isto?"
O cão Perro, irrequieto, mal cabe no carro. De pelo e olhos negros, espreita curiosamente pela janela. Na mala tem a sua taça e, às patas, tem o saco da ração, já quase vazio. "Viver assim é uma violência para os três. Mas também não o queremos abandonar. Só queríamos que alguém nos ajudasse, nem que fosse a tomar conta do Perro", explica Irene.
Tudo o que tinham ficou para trás. "Deixamos os móveis, televisão, roupa... Não temos onde pôr nada e no carro mal cabemos nós e o Perro", explica Joaquim, com os olhos pregados no chão.
Indignado, lembra que a assistente social sugeriu que Irene fosse para um albergue de mendicidade. Sem garantias de ficar sequer na zona do Porto. Não aceitaram. "Não podia deixar a minha mulher sozinha". E a emoção volta a tomar conta do rosto de Joaquim.
Na Câmara de Gondomar, disseram-lhes que não podiam ir para uma casa da Autarquia, uma vez que vivem no município há menos de três anos. Ao JN, disseram que "a resposta de emergência é competência da Segurança Social", estando, mesmo assim, "disponível para apoiar, no âmbito das suas competências e dos apoios disponíveis".
O JN tentou ouvir a Segurança Social que, até à hora de fecho, não respondeu. Pendente fica a esperança de Irene ou Joaquim encontrarem um emprego. Só assim podem voltar a ter um teto.