Guardado há mais de 180 anos na igreja de Nossa Senhora da Lapa, no Porto, o coração de D. Pedro IV poderá atravessar o Atlântico, em setembro, numa viagem de mais de sete mil quilómetros, até ao Brasil, para a celebração do bicentenário da independência daquele país. Pelo menos é esse o desejo do Governo brasileiro e que, de acordo com o embaixador George Prata, foi acolhido do lado português "com muito boa vontade".
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Já foi feito um pedido nesse sentido à Câmara do Porto (é o presidente da Autarquia quem tem a chave do sarcófago onde está guardada a peça), mas há preocupações sobre se a conservação do coração do primeiro imperador do Brasil ficará comprometida durante a viagem, estando a eventual luz verde dependente de "análise técnica".
Por isso, se não for possível, "poderá gerar alguma frustração", afirmou George Prata, à Lusa. Até porque o grito do Ipiranga foi dado, precisamente, por D. Pedro, cujo corpo está em São Paulo, no Brasil.
A provedora da Venerável Irmandade de Nossa Senhora da Lapa, Maria Manuela Rebelo, contactada pelo JN, confirmou que foi feito um pedido à Câmara do Porto pelo Governo brasileiro para transportar o coração até Brasília e um "contacto informal" com a Irmandade nesse sentido.
O pedido seguirá para votação em reunião de Executivo e, posteriormente, terá de ser aprovado em Assembleia Municipal. Já a presidência da República diz que "não se trata de matéria" da sua competência. No entanto, não desmente a presença de Marcelo Rebelo de Sousa e Augusto Santos Silva nas celebrações no Brasil, a 8 de setembro, como noticiou o "Mundo Lusíada".
viagem de dez horas
Um voo comercial direto entre o Porto e Brasília demoraria cerca de dez horas, mas Duarte Nuno Vieira, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e ex-presidente do Instituto Nacional de Medicina Legal, considera que desde que o transporte seja feito "nas devidas condições, não há implicações" além do risco de acidente. Até porque, disse ao JN, a peça "está preservada" e "irá, certamente, acondicionada". Contudo, o embaixador George Prata disse à Lusa compreender a preocupação, motivo pelo qual o "pedido oficial só será feito depois de se saber que realmente é possível" levar o coração sem danificá-lo.
"O contacto foi feito por mim. Quando estive em Portugal, estive no Porto [em fevereiro], visitei a Câmara Municipal e tive também uma reunião com representantes da irmandade de Nossa Senhora da Lapa", adiantou George Prata.
O processo, acrescentou, "ainda está num estado inicial e há considerações a serem tomadas em conta", nomeadamente "o estado de conservação do coração e saber se ele poderia ser trasladado temporariamente para o Brasil". É algo que está dependente "de análise técnica".
A luta entre irmãos que levou ao Cerco do Porto
Após várias tentativas de recuperar o liberalismo, que fracassaram, deu-se início ao Cerco do Porto, em 1832. A luta entre os irmãos deixou D. Pedro - acabado de desembarcar no Mindelo -, e as suas tropas cercados durante cerca de um ano pelo regime absolutista do irmão, D. Miguel. Os liberais resistiram e acabaram por vencer. Como agradecimento, D. Pedro IV entregou o coração ao Porto. O ato da entrega do coração à Cidade Invicta está inscrito numa gravura do monumento a D. Pedro IV, na Praça da Liberdade.
Regresso a Portugal
Depois do regresso de D. João VI a Portugal, foi o seu filho mais velho, D. Pedro IV, quem ficou no Brasil. Lá, em 1822, declarou a independência do país e tornou-se imperador.
Morte de D. João VI
Após a morte de D. João VI, foi D. Maria da Glória, filha de D. Pedro IV, quem sucedeu ao trono português.
Absolutismo
D. Pedro IV negociou com o irmão, D. Miguel, que estava no exílio na Áustria, o regresso a Portugal. Casaria com a sobrinha e seria regente do reino enquanto fosse menor. Mal assumiu o poder, instaurou o movimento absolutista.