O Ministério Público de Vila Verde acusa quatro membros de uma família do crime de escravidão, por terem mantido nessa situação e sujeito a maus-tratos, durante 25 anos, um jovem com deficiência moderada.
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O casal e os seus dois filhos, residentes em Coucieiro, Vila Verde, são acusados de, durante aqueles anos, terem obrigado um jovem com deficiência moderada a desempenhar trabalhos pesados, sem direito a qualquer recompensa, sob maus-tratos, agressões violentas e condições de vida sub-humanas.
Rui Manuel Machado, hoje com 35 anos, está sob a vigilância da Segurança Social e entregue aos cuidados de uma família de acolhimento de Travassós.
Rui foi libertado da Quinta de Mascate em 24 de Novembro de 2004, na sequência de uma denúncia dirigida à Linha de Emergência Social. A GNR de Vila Verde e os técnicos da Segurança Social encontraram o jovem num estado deplorável, física e psicologicamente.
Segundo a investigação do Ministério Público, Casimiro Alves (dono da Quinta de Mascate), a sua mulher, Rosalina Silva, e os filhos de ambos, José Pedro e Maria de Fátima, são acusados de privar Rui Manuel "da consciência da sua própria liberdade e de toda a dignidade humana", em co-autoria material, na forma consumada e em concurso real efectivo na prática de um crime de ofensa à integridade física grave e um crime de escravidão.
A história de Rui Manuel ficou traçada com o internamento da mãe na Casa de Fontarcada, na Póvoa de Lanhoso, por sofrer de deficiência profunda. É então que, com apenas 12 anos, Rui fica entregue aos cuidados dos primos em segundo grau, Casimiro e Rosalina. Só que essa acabaria por revelar-se a pior das soluções para o jovem - deles viria a sofrer agressões físicas e psicológicas.
O despacho de acusação aponta um rol de maus-tratos infligidos a Rui Manuel. Ainda criança, ficou obrigado aos trabalhos da lavoura, tendo sido privado da frequência da escola. Dormia e comia na antiga adega.
Durante as obras realizadas na casa principal da quinta, Rui foi o responsável pelo transporte, às costas, dos sacos de cimento e demais material de construção, pelo que apresenta graves lesões e uma curvatura nas costas e nas pernas, semelhante a um homem primitivo.
"O ofendido apresentava um aspecto muito sujo e debilitado, bem como inúmeras lesões físicas, designadamente hematomas na cabeça e escoriações na face", lê-se na acusação, seguindo-se a especificação de 28 lesões físicas (nove cicatrizes) e onze desvios comportamentais.
Entre os actos descritos na acusação estão os testes ao funcionamento da cerca eléctrica dos animais. Rui Manuel era obrigado a pôr as mãos na cerca para verificar se havia descargas eléctricas.
O jovem só por uma vez, em 1994, foi a uma consulta médica e mesmo assim com o intuito de ver confirmada a invalidez que lhe daria o direito a reforma.
No entanto, Rui nunca chegou a receber a pensão a que tinha direito. Casimiro apropriou-se dessas quantias, que totalizaram 19 mil euros, endossando os vales postais a si próprio.