Fenómeno entre pessoas com 65 anos ou mais cresceu nas duas cidades na última década, apontam os Censos 2021. Subida do imobiliário expulsa camadas jovens e população envelhece rapidamente, nota sociólogo.
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Há cada vez mais idosos a viverem sozinhos nas cidades. No Porto, são mais cinco mil do que em 2011. De acordo com os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), o fenómeno cresceu na última década e no ano passado, em Lisboa, haveria também mais seis mil pessoas com 65 anos ou mais a viverem sozinhas. Ou seja, só nestas duas cidades, há mais 11 mil idosos nesta condição.
Mas nem todos estão em situação vulnerável. Aliás, a GNR tem sinalizados mais de 44 mil idosos em todo o país, dos quais 875 vivem no Porto (o número mais baixo) e 1134 em Lisboa.
O sociólogo João Teixeira Lopes analisa o caso do Porto: "Resistem alguns idosos por via da proteção que ainda é possível encontrar na lei do arrendamento". Ou seja, as rendas antigas mantêm-se e não há ações de despejo. Por outro lado, a população ativa "é completamente expulsa do Porto", fruto da especulação imobiliária e da incapacidade de cobrir os valores, "e o concelho envelhece mais".
"As cidades que têm mercados habitacionais mais fechados, pressionados pelo turismo, pelo alojamento local, e onde o preço das casas sobe muito e o arrendamento também, vão ser sempre cidades menos habitadas. Há uma parte da habitação que é fantasmagórica, que é só usada uma parte do ano, e as pessoas vão procurar casas noutros concelhos das áreas metropolitanas ou até mesmo fora dessas áreas", observa.
Apesar de, em cidades como o Porto e Lisboa, existirem "coberturas de rede de saúde muito acima da média nacional", "o grande problema é se, nos locais onde estes idosos habitam, por via do despovoamento, esboroaram-se as redes locais de solidariedade".
"Se há densidade na vizinhança, estas pessoas são conhecidas, facilmente identificadas e os seus problemas podem ser resolvidos por meio informal. Se, pelo contrário, são os´únicos resistentes como, por exemplo, de um prédio para alojamento local, não vão ter apoio a não ser que tenham alguma rede familiar. Caso contrário, vivem num risco enorme", alerta.
"ausência do estado social"
Outro dado revelado pelo INE no trabalho dos Censos 2021 é o crescimento do índice de dependência entre os idosos, sendo que este indicador é mais evidente nos municípios de Pampilhosa da Serra, Vinhais e Vimioso. Nestas regiões, o fenómeno explica-se de outra forma: "Há a questão do isolamento, sem dúvida, mas o problema é outro". Para o sociólogo, uma das preocupações é "o facto de os serviços públicos" não chegarem até essas manchas de população.
"É a ausência do Estado social. Não há um centro de saúde próximo, não há um posto de correios, nem muitas vezes junta de freguesia porque houve fusão. O Estado deixou de estar presente nesses locais e, com isso, a invisibilidade dos idosos é muitíssimo maior", diagnostica. v
"Reformers"
Este ano, a associação "Transformers" criou um projeto para combater o isolamento social na Área Metropolitana do Porto. Chama-se "Reformers" e durante nove meses um grupo de voluntários partilha talentos com idosos isolados. Estão a decorrer atividades na Junta de Freguesia de Paranhos.
Projeto-piloto
A proposta de Orçamento para 2023 aprovada pela Câmara do Porto prevê a implementação de um projeto-piloto para serviço regular de transporte a pedido nas zonas de maior impacto social, junto de idosos e comunidades mais vulneráveis no concelho portuense.