Famílias das ex-colónias queixam-se da humidade em tetos e paredes do bairro e do cheiro irrespirável. Empresa quer fazer obras com apoio do PRR.
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Álvaro Belo, 71 anos, perdeu a conta às vezes que caiu na cozinha, por tropeçar com as canadianas no revestimento do chão, que se encontrava levantado. Residente no Bairro de Sá Carneiro, em Leiria, cansou-se de esperar pelas obras prometidas pela NHC Social, empresa proprietária da maioria dos apartamentos, e mudou o pavimento. Mas o problema mais grave, para os moradores, é a humidade, visível nos tetos e nas paredes, e que impregna o ar. A NHC planeia intervir nas casas, mas não avança com datas.
A morar no bairro há seis anos, Álvaro e Deolinda Belo, 66 anos, mudaram-se para um apartamento no rés do chão, há três anos, porque o ex-mecânico tem uma prótese na anca e dificuldade em andar. Desde então, aos poucos, têm arranjado portas, torneiras, lava-loiças, canalização e pintado tetos e paredes, com problemas constantes de infiltrações. "Já investimos perto de dois mil euros, mas nunca recebemos um tostão", lamenta Deolinda.
Luís Gomes, 42 anos, reabilitou o apartamento onde vive com a mulher e a filha, com o apoio de amigos, mas esteve cerca de um ano sem pagar renda. Residente no bairro desde os cinco anos, diz que tem havido sucessivas promessas de arranjar as habitações, mas "continua tudo na mesma", o que o levou a pôr mãos à obra. Tapou ainda os buracos nos passeios, junto ao prédio onde mora, de onde saem ratos. "Quem mora no rés do chão, está sempre preocupado."
Ar irrespirável
As infiltrações são a principal dor de cabeça dos moradores, ao ponto de deixarem as portas dos prédios abertas para o ar circular. "O cheiro a humidade é tal que se sente dificuldade em respirar. Fizeram obras na parte de fora dos prédios, mas por dentro está tudo igual", garante Marcelo Velosa, 24 anos. "A casa da minha mãe fica no 2.º andar e a água vai até ao rés do chão. Tem de se estar sempre a limpar", conta. "É um bairro velho, que já devia ter ido abaixo", defende.
"O engenheiro da NHC vem aqui tirar fotos à humidade, mas não resolve nada", denuncia Helena Costa, 63 anos. O marido, Américo Costa, 67 anos, assegura que, desde que fizeram obras no exterior dos edifícios, "as casas ficaram pior, porque não respiram". As manchas escuras são visíveis no teto e nas paredes. "A humidade e o frio é que nos matam", confirma Judite Ramusga, 76 anos. "Põem um remendo aqui e outro ali, mas passados seis meses está tudo igual", denuncia. "Os tubos [canalizações] estão velhos e têm de ser substituídos."
"As pessoas merecem melhores condições de vida, só que o nosso orçamento resulta do valor das rendas, cuja média é de 60 euros", afirma Albertina Mateus, da NHC Social. "Ainda estamos a pagar o empréstimo do capoto [isolamento térmico e acústico]." A preparar uma candidatura ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), para remodelar as casas de banho e as cozinhas, desconhece quando iniciarão as obras.
Construído em 1985 para acolher famílias das ex-colónias, o bairro social tem mais de 700 moradores.