É ver para crer. António Alves só acredita que a aldeia de Vimieiro vai ter o Centro Interpretativo do Estado Novo depois de ver requalificada a Escola-Cantina Salazar. "Dr. Salazar, que era assim que se chamava", corrige o morador, que quer a obra na terra. "Dizem que fazem, mas até agora nada", lamenta.
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Há 12 anos que o projeto é anunciado e adiado "sobretudo por causa de questões de financiamento", justifica o socialista, Leonel Gouveia, presidente da Câmara de Santa Comba Dão desde 2013. O autarca diz que agora é que é e só falta o empreiteiro iniciar a obra de 150 mil euros e terminá-la até ao final do ano.
O edifício em pedra, da década de 40 do século passado, fica ao lado da casa onde viveu o presidente do Conselho de Ministros do Governo ditatorial do Estado Novo. "Esta primeira fase é para requalificar o edifício, a cobertura, casas de banho e musealizar uma sala, que será multimédia e terá alguma documentação, com a colaboração do Centro de Estudos da Universidade de Coimbra", explica. A sala, será "a rampa de lançamento" para ser criada uma rede de outros projetos, ligados a outras figuras. "Estamos a falar, por exemplo, de Aristides Sousa Mendes, em Carregal do Sal, da Casa da República, em Penacova, ou à família Lacerda, relacionada com os sanatórios do Caramulo", exemplifica.
Duas petições
Assim que o Centro Interpretativo do Estado Novo foi anunciado, avançaram duas petições na Internet. A primeira, "Museu Salazar, não" da autoria de 200 antigos presos políticos, com mais de 16 mil assinaturas, vai ser remetida ao primeiro-ministro e faz um apelo ao Governo para "impedir a concretização de tal projeto que, longe de visar esclarecer a população e, sobretudo, as jovens gerações, se prefigura como um instrumento ao serviço do branqueamento do regime fascista e um centro de romagem para os saudosistas do regime derrubado com o 25 de Abril".
A outra petição "Museu Salazar, sim" dirigida à Assembleia da República, tem mais de nove mil assinaturas. "Apoiando ou não a obra de Salazar e o que se passou durante o Estado Novo, todos temos o direito de conhecer os factos de forma isenta. Não aceitamos que aqueles que evocam constantemente o valor da liberdade se revelem inimigos dessa mesma liberdade, quando ela não vai de encontro aos seus interesses", lê-se.
O autarca Leonel Gouveia, clarifica: "Isto não é um nenhum santuário a António Oliveira Salazar, nem uma manifestação de ódio. O século XX existiu e tem de ser relatado".
Na Rua do Vimieiro, onde Manuel Esteves tem casa de férias, não se percebe a polémica. "A sociedade portuguesa tem este complexo, mas um museu serve para estudar, cria postos de trabalho e traz gente", defende.
MEMÓRIA
Avenida
A casa onde o homem do Estado Novo viveu e a escola que vai acolher o centro interpretativo, localizam-se à beira da antiga estrada de ligação a Coimbra, denominada Avenida António Oliveira Salazar.
Cemitério
A população de Vimieiro testemunha que há muita gente que se desloca à aldeia para visitar o cemitério onde o estadista foi sepultado há 49 anos, a cerca de quatro quilómetros da casa onde viveu.