Tendência contra o consumo desenfreado da moda tem cada vez mais adeptos, de todas as idades.
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Não há dinheiro envolvido. É de trocas de produtos que se trata. Os mercados de trocas são eventos que começaram a ser realizados, há alguns anos, em Portugal, e que têm crescido a passos largos em vários pontos do território. Quem ali vai pode levar de casa roupas e livros, escolhendo depois outras peças – sempre em segunda mão – para lhes dar uma nova vida. Há duas associações, a nível nacional, que promovem esse tipo de eventos: a Let’s Swap, nascida no Porto, e a Mercado de Trocas, fundada em Loulé. E os participantes são já às centenas, de diversas faixas etárias e géneros.
Contrariar a tendência de consumo desenfreado da moda, combater a chamada “fast fashion”, e providenciar alternativas mais sustentáveis. Foi por isso que, em 2018, um grupo de amigos, do Porto, começou a fazer eventos de trocas de bens – roupa e livros –, inicialmente apenas para conhecidos. “Pensávamos que não iria ter muita adesão por parte das pessoas, até porque nessa altura a perceção da moda em segunda mão era muito diferente da que existe hoje. Mas, depois, começámos a ver que, afinal, havia adesão e começámos a abrir outros núcleos no país”, conta ao JN Helena Oliveira, fundadora da Let’s Swap, que se constituiu como associação há três anos.
Era altura, por isso, de desbravar caminho e de aprimorar o conceito. Nos eventos da associação – que costumam ser mensais, com exceção para agosto –, os participantes são chamados de “swappers”. Habitualmente, podem levar um máximo de cinco peças de roupa e de cinco livros. No “check-in”, à entrada do mercado, os voluntários avaliam o estado dos objetos. E a cada item é atribuído um número de pontos – um vestido ou um casaco valem cinco pontos, por exemplo, um livro, três e uma t-shirt, dois.
“Sentimos que a pontuação ajudava a ter uma perceção parecida com o dinheiro. E isso ajuda a que as pessoas tenham um bocadinho mais de confiança para participar num evento deste género”, realça Helena, que garante que os mercados são frequentados por um grupo heterogéneo de pessoas – “no início, eram mais raparigas entre os 18 e os 35 anos, agora temos famílias e homens que vêm sozinhos”.
Núcleos e “app”
Hoje, a associação já tem oito núcleos no país: Porto, Lisboa, Aveiro, Braga, Guimarães, Guarda, Viseu e Tomar. E o crescimento obrigou a melhorar o método. Por isso, a Let’s Swap desenvolveu uma “app”. “Permite que qualquer pessoa consiga aceder à sua conta e ter os pontos todos registados num único sítio. O que não levar num mercado, pode usar os pontos e levar, ao longo do tempo, noutros mercados”, explica a fundadora. Na última vez que verificaram, tinham mais de 1000 utilizadores.
Na maioria dos mercados da Let’s Swap é cobrado um euro de entrada, para ajuda de custos de manutenção da associação. O mesmo valor que é pedido, também, pela Mercado de Trocas, que nasceu oficialmente em 2020, em Loulé.
Ali, foi Marta Chae que, ao regressar à terra natal, após três anos a viver em Lisboa, sentiu necessidade de criar mercados de trocas de roupas em segunda mão, como aqueles que frequentava na capital. “Mas o que eu não gostava em Lisboa era de os mercados serem esporádicos. Então, comecei a fazer aos segundos sábados de cada mês, em Loulé. Depois, uma rapariga de Olhão, que eu não conhecia, contactou-me para fazer lá também. Daí, umas participantes quiseram fazer em Faro. E, pronto, foi crescendo”, recorda Marta.
Fim do estigma
Neste momento, a Mercado de Trocas faz eventos regulares em oito localidades (a mais a norte decorre em Aveiro), com outros dois núcleos, que atualmente estão parados, a retomar atividade em setembro.
O conceito é semelhante, mas a forma de funcionamento é ligeiramente diferente da Let’s Swap. “Não damos pontos ou um valor exato à peça. Vamos pela necessidade da pessoa e não pelo que a peça vale”. Por isso, um participante pode dar à troca uma t-shirt e levar um casaco. “A pessoa traz oito coisas, mas só encontrou cinco para levar. No ‘check-out’, damos uma senha com a diferença, três, para usar em qualquer um dos nossos mercados, no país inteiro”, concretiza Marta.
Os artigos em segunda mão têm cada vez mais adeptos porque “as pessoas perceberam, finalmente, que era tudo um estigma e que roupas em segunda mão não cheiram mal nem estão em más condições”, responde Marta. “Basta higienizá-las e dar-lhes uma segunda vida. E, depois, há a questão económica, claro”, conclui.
Joana Cachopo tem uma saia de cores terra e folhos na mão. Ainda não sabe se a vai levar para casa, mas, à primeira vista, agradou-lhe. É a primeira vez que está num mercado de trocas. Soube da iniciativa “Trocar É Chique” pelo site da Câmara de Ílhavo e decidiu ir, sozinha, passar uma tarde diferente ao Fórum Maior Idade, na Gafanha da Nazaré. Levou consigo algumas t-shirts e um casaco, que entregou à entrada. Como retorno, foram-lhe atribuídos 25 pontos, que agora pode trocar por peças em segunda mão que estejam expostas. Se não gostar de nada, já sabe: no próximo evento da Let’s Swap – parceira da Câmara neste tipo de eventos –, em qualquer ponto do país, pode usar os pontos como se dinheiro real se tratasse.
“O engraçado disto é que, como está sempre a chegar roupa, temos coisas diferentes para ir escolhendo. Já vi as minhas coisas algures aqui expostas”, declara Joana, enquanto explora um dos vários “charriots” com peças de diversas tipologias. Natural do Alentejo, mas a viver em Aveiro, Joana explica que se deslocou ali “na desportiva”. E acrescenta que lhe agradou o ambiente “descontraído e tranquilo” que encontrou.
Já Sara Lopes, também de Aveiro, é participante habitual em mercados de trocas. Começou incentivada por uma tia do namorado e não deixou mais de ir. “Venho para dar uma oportunidade às roupas que tenho em casa e que já não uso. Em vez de gastar dinheiro, estamos a aproveitar o que já temos”, frisa.
Sara assegura que não é uma pessoa muito consumista. “Compro apenas quando é necessário. Mas quando encontro uma peça que até tinha pensado comprar, já não compro porque encontrei aqui”, adianta a jovem, que todos os meses vai a outro mercado semelhante, em Aveiro, que acontece no Ecocentro, em parceria com outra associação, a Mercado de Trocas.
Agenda
26 de julho: Aveiro
Ao quarto sábado de cada mês, o Ecocentro de Aveiro recebe um mercado da Mercado de Trocas, na Zona Industrial da Taboeira, em frente ao miradouro. Das 14 às 17 horas.
27 de julho: Olhão
A Associação Cultural e Ré-Creativa República 14, em Olhão, recebe o mercado no último domingo de cada mês. É destinado a adultos e decorre entre as 17 e as 19.30 horas.
6 de setembro: Loulé
O Mar Shopping, em Loulé, tem um mercado de trocas no primeiro sábado do mês, das 10 às 13 horas. Em agosto, não há mercados em nenhum dos locais.
13 de setembro: Fuseta
Na Fuseta, Olhão, os mercados acontecem aos segundos sábados, entre as 17 e as 20 horas. Localizam-se na zona ribeirinha, em frente aos barcos da carreira.
Setembro: Seixal e Leiria
A Mercado de Trocas espera regressar em setembro ao Seixal, ainda sem data. E também quer voltar a Leiria, ao Centro Comercial D.Dinis.