"O meu pai sempre me disse que quem nasce do caminho para baixo é de Vale de Cambra, e os que nascem para cima são de Oliveira de Azeméis. Há mais de 50 anos que o caminho faz a divisão".
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Carlos Soares, 62 anos, vive no lugar de Teamonde, onde a fronteira entre a freguesia de Carregosa, Oliveira de Azeméis, e a de Vila Chã, Vale de Cambra, nunca foi clara. O imbróglio dos limites é tão dúbio que no cartão de cidadão a sua morada é Vale de Cambra e a da mulher é Oliveira de Azeméis.
A Rua do Limite dividia as duas freguesias há décadas, num acordo de cavalheiros entre juntas. Por isso, Carlos sempre foi carregosense, mas quando construiu casa teve de a licenciar em Vale de Cambra. "A casa do meu pai fica paredes meias e está licenciada por Azeméis", diz, apontando para o outro lado da rua: "Esta em frente pertence a Oliveira de Azeméis. Aqui fomos sempre de Carregosa. Até o número da minha porta é de Carregosa". A confusão chegou a obrigar o seu pai a pagar IMI nos dois municípios.
"Isto tem lógica?", atira Carlos, explicando que a mulher, Julieta Costa, conseguiu mudar a morada para Carregosa. "A correspondência da minha mulher nunca parava aqui. E ela pediu para mudar o código postal para Oliveira de Azeméis". Ele continua em Vale de Cambra. Cada um vai a um centro de saúde e, nas eleições, votam em concelhos diferentes. Mas ele recusa votar nas autárquicas: "Sou oliveirense".
Troca de argumentos
Segundo Helena Moreira, presidente da Junta de Carregosa, o caso surgiu de forma mais visível nos censos de 2001, quando detetaram que algumas casas acima do limite estavam registadas em Vale de Cambra. "Vila Chã registou terrenos rurais como seus, antes de serem construídas casas", explica, dizendo que "a população se recusou a responder aos censos a favor de Vila Chã, aonde não pertencem".
No lugar há uma antiga escola feita pela Câmara de Azeméis que, a manter-se a divisão, passa para Vale de Cambra. A autarca reavivou o tema e seguirá a via judicial se não houver acordo. "As questões administrativas não se podem sobrepor à identidade do povo".
Mas Vila Chã não cede, porque, diz Manuel Campos, presidente da União de Freguesias de Vila Chã, Codal e Vila Nova de Perrinho, "Carregosa é culpada". "O mapa nunca foi cumprido e tiraram-nos uma rua no lugar de Arrifaninha, que pertenceu sempre a Codal, alegando o cumprimento do mapa. Então fizemos o mesmo em Teamonde e anulámos o antigo pacto. Se cederem 26 casas em Arrifaninha, nós cedemos 70 em Teamonde", concluiu.