Numa conversa de café, no âmbito do "Terra Justa - Encontro de Causas e Valores da Humanidade", que decorre em Fafe até sábado, Almeida Santos, presidente da Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos (OVAR), foi duro para com os poderes políticos no que concerne ao atual estado do sistema judicial em Portugal, nomeadamente no que diz respeito às prisões.
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"Os governantes violam tratados e convenções, violam a lei e não são condenados, reclamando o estatuto de imunidade. Não devem merecer o nosso voto. Um desgraçado que rouba, muitas vezes para comer, vai preso", começou por afirmar.
Para Portugal apresentar números sempre abaixo do nível médio da Europa no que concerne à população reclusa, o líder da OVAR também aponta o dedo a uma questão cultural que está intimamente ligada "à atitude de ódio, de vingança em vez de uma cultura de compreensão de tentar arranjar explicações que a opinião pública vai protagonizando", tornando-se, na opinião de Almeida Santos, "o maior inimigo da humanização das estruturas prisionais". Também a comunicação social não fica de fora do rol de críticas que este ativista faz, considerando que "não pode ter um papel de incitamento ao castigo".
Os alertas que Almeida Santos tem feito em fóruns de decisão política, como a Assembleia da República, não têm tido efeito prático, o que leva o presidente da OVAR a dizer que "não é a justiça que comanda a nossa vida são os votos", faltando coragem para a tomada de decisões.
Legalização das drogas
Não há escola nenhuma em que não haja dois ou três dealers
A droga é responsável por 80% da comunidade reclusa em Portugal e Almeida Santos salientou que é "uma guerra inútil", propondo que se dê um passo em frente para mitigar este flagelo. "As drogas têm que ser enquadradas legalmente. É permitido o consumo mas tem que haver quem a venda, quem a produza. Não há escola nenhuma em que não haja dois ou três dealers e a legalização acaba com isto", defende, instigando os poderes a "reforçar as campanhas de sensibilização. Tem que se enquadrar legalmente como se fez com o tabaco e o álcool".
Psicólogos ganham 5 euros/hora para ouvirem reclusos
Pelo meio de várias críticas à forma como é gerido o sistema prisional, Almeida Santos denunciou o caso de psicólogos que ganham 5 euros/hora para ouvirem e aconselharem os reclusos porque "há vagas nos quadros das prisões mas o Ministério das Finanças não permite as contratações e contratam empresas de prestação de serviços". A concluir, o presidente da OVAR mostrou-se indignado com o facto de "em média um recluso ganhar 2 euros por 8 horas de trabalho" e deu um exemplo: "reclusas a fazer mochilas que depois são vendidas no El Corte Inglés a 60 euros e elas tinham de fazer três mochilas para ganhar dois euros".
Reclusas ganham dois euros a fazer três mochilas, que são depois vendidas a 60 euros cada
A OVAR foi homenageada esta quinta-feira à noite no Teatro-Cinema de Fafe pelo trabalho que desenvolve nas prisões portuguesas.