No Bonfim, há quem viva em carros e tendas. "Estou na classe de sem-abrigo, mas não me sinto assim"
Na zona das Eirinhas, no Bonfim, vivem pessoas em carros e tendas. Há quem recuse acolhimento e opte por apoio alimentar Plano municipal prevê gestor de caso para utentes.
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José - chamemos-lhe assim, porque prefere resguardar a identidade - é lapidar, mas sereno. "A heroína é uma viagem sem regresso", diz, taxativo, apoiado na traseira da carrinha de mercadorias a que chama casa desde a pandemia. Estacionou-a à porta do antigo Hospital Joaquim Urbano, na zona das Eirinhas, no Bonfim, e não por acaso: fica a poucos passos do Centro de Acolhimento Temporário Joaquim Urbano (CATJU), onde recusou instalar-se, aceitando apenas fazer ali as refeições e a higiene diária. E não está longe da AMI - Assistência Médica Internacional, que também apoia pessoas sem-abrigo.
A escassos metros da carrinha de caixa alta que José adquiriu quando "a senhoria não quis renovar o contrato nem negociar a renda" do apartamento que partilhava com o irmão, dois argelinos vivem num exíguo Peugeot 106. Há garrafas de água, louça e embalagens de comida no chão. Omar Beluekil, de 41 anos, senta-se no banco traseiro e deita-se sobre a bagageira. Conta que está em Portugal há "um ano e seis meses" e que trabalhou numa plataforma digital de entregas, mas diz que a aplicação o "bloqueou há três meses", e desde então está sem emprego.