Pior ano de sempre para os apicultores transmontanos com quebras de produção que podem chegar aos 90%. A seca e os incêndios estão na origem do decréscimo.
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O presidente da Associação dos Apicultores do Nordeste (AAN) não tem dúvidas que, dos 40 anos que está ligado ao setor, 2022 é o mais fraco de sempre de produção de mel na região. "Batemos no fundo. A média anda nos três, quatro quilos, quando num ano normal chega a ser de 20 quilos por colmeia. Mas neste ano houve apicultores que tiveram meio quilo de produção por colmeia", revela José Carneiro, dando o exemplo de Ivo Alves (texto em baixo).
A Associação dos Apicultores do Nordeste abrange 500 produtores de mel com 50 mil colmeias de vários concelhos dos distritos de Bragança, Vila Real e Guarda. José Carneiro revela que esta quebra de produção, que tem vindo a acontecer nos últimos três anos, já levou à diminuição de mais de duas mil colmeias. "Alguns abandonam, outros diminuem os efetivos e como há menos abelhas, menos colmeias, a produção também é menor", frisa.
Se já não bastasse o problema dos incêndios, também a seca veio agravar situação, porque afetou a floração e com isso fica comprometida a sobrevivência das abelhas, porque não têm alimento. "Há um espaço de tempo em que as abelhas têm ao seu dispor o néctar. Se não vem tempo bom para poderem trabalhar porque não existe floração, como agora aconteceu, elas não saem das colmeias e não se alimentam, pelo que os apicultores já estão a alimentar com açúcar as suas abelhas", adianta o líder associativo.
"Sem palavras" para o apoio
Perante este cenário, José Carneiro queixa-se de falta de apoios por parte do Governo. "Veio agora uma ajuda, apenas para os apicultores afetados pelos incêndios, de 700 gramas de açúcar por colmeia. Nem tenho palavras para classificar isto, porque o apicultor gasta por colmeia cerca de 10 quilos. Veja o apoio que estão a receber", lamenta.
Aquele dirigente entende que devia existir maior sensibilidade da parte do poder central para o setor, lembrando a importância que as abelhas têm para a agricultura. "Por exemplo, a amendoeira depende de cerca de 70% da polinização dos insetos e as abelhas aqui são fundamentais para que a produção da amêndoa seja boa, e nós temos as nossas abelhas instaladas um pouco por toda a região", conta José Carneiro, acrescentando que a apicultura "é uma mais-valia para toda a sociedade que não é apoiada", lamenta
O concelho de Mirandela é aquele que regista a maior quebra na produção na região transmontana, a que não é alheio o facto de ser o segundo concelho do país com mais colmeias, com perto de 10 mil, sendo apenas ultrapassado por Loulé, no Algarve.
Meio quilo de mel numa colmeia que dava 20
Ivo Alves, apicultor de Lamas de Orelhão, Mirandela, está desolado. "Este ano, tenho colmeias que produziram meio quilo de mel, quando num ano normal cheguei a ter 20 quilos por cada uma", afirma.
O jovem apicultor de 33 anos começou a atividade, em part-time, aos 20. "Tinha 10 colmeias, agora tenho 200, mas vou ficar por aqui", alegando que, nos últimos três anos, o setor deixou de ser rentável. "Chove cada vez menos, os enxames deixam de ter alimentação, muitas abelhas acabam por morrer e isto desmoraliza. Só continuo por gostar disto, mas sei de muita gente que está a pensar em desistir", confessa.
Ivo lamenta a falta de apoios do Governo. "Só de julho até agora, já gastei uma palete de açúcar para alimentar as abelhas, o que representa perto de 1000 euros, e vou ter de comprar outra para o inverno", acrescentando que o setor foi "completamente esquecido na nova PAC (2023/2027)".
Produção
50 mil colmeias estão espalhadas pelos distritos de Bragança, Vila Real e Guarda, que produzem anualmente cerca de mil toneladas de mel. Este ano, não chegarão às 200 toneladas.