Mais de nove meses depois da grande cheia de Dezembro, o rio Tinto ainda acusa a devastação. Houve intervenções pontuais, mas as grandes reparações continuam por fazer e pode passar outro Inverno sem que obras nas margens que derrocaram sejam feitas.
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A Administração da Região Hidrográfica (ARH) do Norte atribuiu, no dia 7 de Setembro, cerca de 304,5 mil euros à estabilização do talude marginal do rio Tinto, dando provimento à candidatura da Câmara de Gondomar ao Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos. Todavia, com todos os procedimentos necessários - como a abertura de concurso, avaliação de candidaturas e adjudicação - , a intervenção poderá começar, na melhor das hipóteses, em pleno Inverno, explicou ao JN o vice-presidente da Autarquia, José Luís Oliveira.
"Queríamos começar as obras ainda antes do Inverno, mas não podemos garantir", disse ao JN, atribuindo o atraso à demora do protocolo que agregou na intenção de reparar estragos várias entidades - Câmara, Águas de Gondomar e ARH/Norte. O Inverno é precisamente aquilo que mais temem aqueles que vivem junto ao rio que deu nome à freguesia mais populosa de Gondomar.
No fim-de-semana passado, o temporal da madrugada foi amostra do que pode acontecer: de manhã, a água tinha subido ao ponto de submergir a ponte do Caneiro e quase galgar margens na Levada e no Meiral, as zonas mais críticas. "Foi mais um episódio de aflição", disse o presidente da Junta de Freguesia, Marco Martins.
O autarca aponta o assoreamento como um dos maiores problemas causados pelas cheias de 21 para 22 de Dezembro. Nessa altura, o rio ficou cerca de um metro e meio mais alto e assim se mantém. A Câmara já pôs máquinas a limpar pedras e entulho em alguns locais, mas as chuvas da Primavera voltaram a arrastar materiais.
Marco Martins começa a ouvir queixas mal põe o pé na Travessa do Meiral, onde 13 casas já foram invadidas pela água, algumas delas pela primeira vez em Dezembro passado. "Ó senhor presidente, estamos aqui esquecidos?", atira Maria Aurora, a viver paredes meias com o rio Tinto há 26 anos. "Isto é para passarmos a noite a espreitar", diz a moradora.
No Caneiro, as chuvas de Abril obrigaram pessoas a sair de casa à pressa. "Se chover metade do que choveu no Inverno passado, vamos ter problemas", alerta Marco Martins. À subida do leito, acresce a destruição de margens e taludes que continua por reverter.
A ponte do Caneiro foi remendada, mas parte do passeio continua em ruína. Apesar de uma limpeza ter sido feita, o rio voltou a ser entupido de pedras. Na Levada, junto ao Centro de Saúde, o desnível natural do rio foi arrasado e o colector de esgotos que rompeu e esteve meio ano a descarregar directamente no rio foi alvo de uma reparação, mas só provisória. O passeio derrocou e está vedado.
A Câmara vai reparar as margens com os 304,5 mil euros do Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, mas reserva a intervenção de fundo para quando estiver concluído um estudo da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, que deverá apontar caminhos para a requalificação total do rio Tinto. "Vamos esperar por esse estudo e depois segui-lo na medida do possível", afirmou José Luís Oliveira.
À vista das derrocadas, a poluição, por não se ver, poderia parecer problema menor. Só que no dia da reportagem do JN via-se e cheirava-se. Descargas provenientes da Ribeira da Castanheira, que acontecem há duas semanas, deixaram o rio cinzento e com um cheiro pestilento da Levada até ao Meiral.
Duas moções apelando a solução urgente para os problemas do rio Tinto foram aprovadas, na semana passada, pela Assembleia de Freguesia de Rio Tinto e pela Assembleia Municipal de Gondomar. Os deputados de freguesia pediram limpeza urgente do leito do rio e reparações na Levada. No órgão municipal, recordou-se a promessa da ministra do Ambiente, aquando da atribuição dos financiamentos do Fundo de Protecção dos Recursos Hídricos, em criar um Programa Polis para os rios. Por unanimidade, foi pedido à Câmara que prepare o processo para uma candidatura assim que o programa for lançado, com vista à despoluição e reabilitação do rio.