Desativado desde os anos 90, edifício esteve para ser vendido no tempo de Rui Rio. Desde 2013 até agora, foram conhecidos três projetos de reconversão.
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A proposta para o antigo matadouro que aguarda nova decisão do Tribunal de Contas é a segunda da era Rui Moreira. Em 2016, ainda no primeiro executivo, o autarca apresentou na 21.ª Trienal de Artes, Design e Arquitetura, em Milão, um projeto tido como revolucionário. Foi desenhado pelo gabinete de arquitetura Garcia & Albuquerque e tinha um custo associado de dez milhões de euros. Na viagem à cidade italiana seguiu também o socialista Manuel Pizarro, então vereador da Habitação e Ação Social, pelo facto de o plano ter uma forte componente social.
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Mas quando decorria a campanha para as eleições autárquicas de 2013, ano em que Rui Moreira chegou à presidência da Câmara, já o cabeça de lista do PS tinha uma ideia concreta para o grande edifício desativado desde os anos 90 e foi no local que a deu a conhecer ao eleitorado. A solução que preconizava tinha "uma forte vertente social, uma forte vertente cultural e um possível ninho de empresas", recorda ao JN o antigo vereador Correia Fernandes, que chegou a ser responsável pelo pelouro do Urbanismo.
Por outro lado, diz Correia Fernandes, o projeto "era de investimento municipal, com eventual concessão de alguns espaços" a privados. Com um montante previsto de dez milhões de euros, pretendia-se fazer uma limpeza e reabilitação estrutural do matadouro, deixando-se os detalhes dos espaços para analisar posteriormente, consoante a função que lhes fosse atribuída.
Nessa altura, em 2013, estava mais do que abandonada a ideia de venda das instalações que Rui Rio, antecessor de Rui Moreira, defendia e que os socialistas, sentados na oposição, acreditam ter feito cair ao ameaçar com um pedido de classificação do imóvel, o que terá afastado os investidores. Já depois das eleições e tendo o presidente independente chegado a um acordo de governo com o PS, surge um novo impulso dado por Paulo Cunha e Silva, o rosto escolhido para repor a vereação da Cultura que Rui Rio tinha abandonado.
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Com o novo vereador, a freguesia de Campanhã passou a ser uma das linhas prioritárias de intervenção cultural do executivo camarário. O projeto do matadouro assentava nos três eixos da governação de Autarquia - coesão social, economia e cultura - e previa a instalação de uma área empresarial e a reabertura do Museu da Indústria (com o acervo que está fechado num armazém de Ramalde desde 2006), entre outras valências. Paulo Cunha e Silva viria a morrer, subitamente, em novembro de 2015.
O figurino mudou com o projeto que agora está em causa. Mantendo-se o objetivo, há décadas na boca dos autarcas, de dar a merecida importância à zona oriental da cidade, o plano para o matadouro assumiu contornos ainda mais arrojados. Em maio do ano passado, a empresa municipal GO Porto anunciava a Mota-Engil como vencedora do concurso para a reconversão do espaço, investindo 40 milhões de euros, e para assegurar a concessão por um período de 30 anos.
O novo desenho é da autoria do japonês Kengo Kuma, em parceria com o gabinete de arquitetura OODA, que tem sede em Matosinhos. "Todo o trabalho foi feito com o cuidado e sensibilidade de quem intervém em património histórico, mas pretendendo criar unidade e identidade", refere a Câmara no seu site. A concessionária prevê construir uma grande cobertura a unir o atual edifício a um novo, além de criar uma passagem por cima da VCI, um jardim suspenso a desembocar a norte da estação de metro do Dragão.
Pretende-se que Campanhã dê o salto há muito almejado, através da fórmula que mistura num só lugar os novos negócios, atividades artísticas e equipamentos sociais.
A necessidade de construção do matadouro foi identificada em 1910, mas o funcionamento em pleno só viria a acontecer em 1923. Nomeado arquiteto municipal em 1911, foi António Correia da Silva (autor dos paços do concelho e do mercado do Bolhão) quem desenhou o edifício e não, como muitas vezes surge referido por várias fontes, o engenheiro Avelino de Andrade.
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Ocupando uma área de 29 mil metros quadrados, o matadouro evidenciava-se, à época, pela modernização que as instalações traziam à cidade, acompanhada por rigorosas regras de higiene nas operações de matança do gado. Foi construído segundo o modelo alemão, desenvolvido em superfície (e não em altura, como o modelo americano), marcado pela organização funcional e já com grandes capacidades em termos de armazenamento frigorífico.
A Corujeira foi o local escolhido por ser pouco povoado (era assim que se fazia nas grandes cidades europeias) e, ao mesmo tempo, por estar a uma distância relativamente curta do centro da cidade. Por outro lado, havia fontes abundantes e a ribeira da Bonjoia tornou-se essencial para o escoamento das águas do matadouro.
Outros fatores contribuíram para a instalação naquela zona: no limite Sul do terreno, a rua de S. Roque da Lameira, principal via de entrada/saída da cidade para Nascente; no limite Poente, as linhas ferroviárias do Minho e do Douro.
O caminho de ferro foi a primeira via a criar uma rutura espacial na zona, em finais do século XIX. Depois, a VCI (via de cintura interna) abria o primeiro troço em 1963, tendo ficado concluída em 1996 a conexão das Antas à ponte do Freixo, a ligação a Gaia sobre o Douro que fica mais a montante. Anos depois, a linha do metro viria a passar em Campanhã, rumo a Fânzeres, no vizinho concelho de Gondomar.
Desativado há mais de 20 anos, o matadouro está inventariado peça Autarquia como imóvel de interesse patrimonial. Desde agosto de 2002 que a 4.ª esquadra da PSP está instalada na antiga casa do diretor, mesmo à face da rua.
Atualmente, funciona como depósito camarário, sendo também o local onde, provisoriamente, se encontram os cães que estão à guarda da Sociedade Protetora dos Animais.