Já viram muitas vezes as portas do mercado de trabalho fechar-se apenas por serem de etnia cigana ou dizerem que moram num acampamento. Para combater o estigma e a discriminação, o município de Paredes encetou um projeto que visa, entre outros objetivos, potenciar a inserção profissional da comunidade cigana que reside no concelho, sensibilizando também os empregadores. Um dos caminhos pode passar por encaminhá-los para a indústria do mobiliário, onde a mão-de-obra escasseia.
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"Sinto-me discriminada quando procuro emprego. Olham para a minha aparência, vêem que sou cigana e dizem-me que já não precisam de ninguém", conta Laura Augusto de 19 anos, que tem o 9.º ano. Foi com curiosidade e interesse que integrou um grupo de ciganos, com idades entre os 18 e os 47 anos e escolaridades do 4.º ao 12.º ano, que visitou o Centro de Formação Profissional da Indústria das Madeiras e do Mobiliário, em Lordelo, para conhecer as oportunidades de formação, saber o que faz um marceneiro, um estofador ou como funciona uma máquina de CNC.
Este centro, por onde passam centenas de formandos por ano, tem uma taxa de empregabilidade acima de 90%. Laura ficou interessada na formação de estofos. O mesmo aconteceu com Manuel Esteves, de 27 anos, que tem o 12.º ano na área de restaurante/bar. "Ainda agora se mandaram dois currículos através deste projeto, fui a entrevista e não fui aceite. Mas, desta vez, não me senti discriminado, só já não estavam a precisar", explica.
Também com o 12.º ano e a mesma formação, Alberto Vilela, de 47 anos, que já trabalhou nas feiras e faz trabalhos agrícolas, não consegue emprego. "Mando currículos e, na hora de ser entrevistado, sou excluído só pela aparência. A nossa fama é tão ruim que as pessoas julgam-nos sem nos conhecerem. Há sempre discriminação, sobretudo nos locais que frequentamos menos. As pessoas olham-nos com desconfiança", conta. "Vi aqui uma maneira de termos uma oportunidade de nos integrarmos na sociedade e de mostrarmos que somos capazes", atesta.
O "(Pa)Redes de Inclusão" começou em novembro e visa melhorar a qualidade de vida e "quebrar barreiras e estereótipos", preparando a comunidade cigana para o realojamento previsto e trabalhando competências em várias vertentes.
Na empregabilidade, as empresas têm sido sensibilizadas para a integração de ciganos nos quadros de pessoal e os candidatos têm sido orientados para a elaboração de currículos e preparação de entrevistas. Também lhe estão a ser apresentadas ofertas de formação. Fruto deste trabalho já houve ciganos chamados a entrevista de emprego. "Mas ainda ninguém foi colocado", diz a vereadora da Ação Social da Câmara, que gera o projeto em parceria com a Misericórdia de Paredes.
Beatriz Meireles confirma a desconfiança quanto a esta comunidade: "Não é por não quererem trabalhar, muitas vezes é não surgirem as oportunidades e não lhes abrirem as portas. Quando diziam que moravam no acampamento ou davam a morada retiravam a oferta de emprego". A autarca acredita que é preciso desmistificar e que, com formação, é possível dar resposta à escassez de mão de obra no setor do mobiliário.
A comunidade cigana de Paredes tem cerca de 90 pessoas e será realojada em habitação social.v