<p>O Marcelo já perdeu dez dias de aulas; a Maria quatro de formação; O João há um mês que não sai à noite e José que não bota as vacas para o monte. Em Pitões das Júnias há neve desde Novembro. Estão todos fartos.</p>
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28 de Novembro. Maria Rodrigues, 35 anos, tem bém presente o dia em que caiu a primeira nevada em Pitões das Júnias, em Montalegre. De então para cá, com mais ou menos espessura, tem havido sempre neve. Ao todo, já terá nevado doze vezes, sim, terá, porque há também quem diga que foram onze ou dez. Certo é que toda a gente concorda na aldeia é que "já é neve a mais".
"Uma ainda se lhe topa graça, agora já é de mais. É uma prisão", lamenta António Teixeira. O vizinho José Teixeira confessa que a excomunga muitas vezes. À neve. Não é para menos. Há três meses que as suas vacas só saem da corte para beber no tanque. Tem doze. No Verão, meteu 2 mil fardos de feno, mas, por este andar, "vai todo". Ana Gonçalves tem 24 vacas e um boi. Por causa de neve não pode ir ao baldio buscar estrume. "Só para lhe fazer a cama, gasto dez fardos de palha por dia", explica.
A Marcelo, de 16 anos, a frequência da neve, este ano, trouxe um hábito. De manhã, a primeira coisa que faz é ir à janela. Para ver o "tamanho da nevada" e aferir se o autocarro da Câmara o vem ou não buscar. Quase sempre acerta. A Elisete passa-lhe o mesmo. E, anteontem, tinha teste. O pai viu-se obrigado a ir levá-la e buscá-la a uma aldeia onde o autocarro chegou. Esta semana, os alunos de Pitões não puderam ir às aulas três dias consecutivos. Mas, desde que a neve começou a cair no concelho, são já dez os dias que não tiveram aulas. "Já chateia um bocado", admite Marcelo, que aproveita as folgas forçadas para "ajudar os pais com o gado".
João Rodrigues "já para aí um mês que não sai à noite" para os bares de Montalegre ou da vizinha Galiza. Mas o que chateia mesmo João são as constantes falhas eléctricas por causa dos nevões. Fica sem a única "ligação ao mundo [Internet]". A irmã, Maria Rodrigues, licenciada em Gestão de Turismo, é formadora. Já falhou quatro dias. A Cátia Cascais a neve não a impede de trabalhar. Está de baixa por causa da gravidez. Mas também a chateia. "Estou farta de estar em casa", dizia, ontem, agarrada a um pau para não escorregar na neve. Mas se a uns chateia, a outros deslumbra. Pelas ruas da aldeia, há vários grupos de turistas de máquina em punho e a brincar com a neve. A população acha que são poucos. "Têm medo e não vêm", afiança Maria.
Com uma frequência muito superior a anos anteriores, os nevões que tem assolado o concelho de Montalegre têm causado inúmeros transtornos aos residentes e deixado a protecção civil do concelho sem mãos a medir. Segundo o presidente da Câmara, a autarquia já esgotou o sal nas "redondezas". Agora trá-lo, a granel, de Guimarães. Tudo para manter as estradas transitáveis e "libertar" as populações. De um paraíso...mas só aos olhos de turistas.