
D. Jorge Ortiga recebeu cartas de duas vítimas
Gonçalo Delgado/Arquivo Global Imagens
D. Jorge Ortiga recebeu denúncia de violência em convento em março de 2014. Principal suspeita foi afastada ano e meio depois, após buscas da PJ e notícias.
D. Jorge Ortiga, antigo arcebispo primaz de Braga, assumiu em tribunal que, em março de 2014, recebeu uma carta de uma antiga "noviça" do "convento" da Fraternidade Cristo Jovem, em Requião, a queixar-se dos maus-tratos sofridos na instituição. Após aquela data, o arcebispo continuou a receber informações sobre o problema, mas só por força de buscas policiais ali realizadas e das notícias que se seguiram, mais de um ano e meio depois, em novembro de 2015, é que a principal suspeita dos maus-tratos sairia da associação de fiéis, que se autodenominava convento.
A data da primeira denúncia foi assinalada por Jorge Ortiga, a semana passada, no julgamento onde o padre Joaquim Milheiro e as "freiras" Maria Arminda, Isabel e Joaquina respondem por escravidão de jovens "noviças" da instituição do concelho de Famalicão.
Falando ao Tribunal de Guimarães como testemunha, o responsável pela arquidiocese de Braga à data dos factos deu conta da primeira carta recebida de Natacha, que fora "noviça" na Fraternidade, e de outra que lhe foi enviada um ano depois por Luísa, também "ex-noviça". Pelo meio, em setembro de 2014, D. Jorge Ortiga teve uma conversa com a irmã Maria Arminda, principal visada nos relatos de violência, em que a mesma confessou ter dado "umas bofetadas". Mas, segundo o arcebispo, "ela prometeu que ia deixar de o fazer".
"Assunto recorrente"
A partir de setembro de 2014, recordou D. Jorge Ortiga, o "assunto era recorrente" nos órgãos da arquidiocese, no sentido de "ver" o que podiam fazer. "O tempo foi passando e surgiu na Comunicação Social, mas, se não fosse assim, íamos agir mesmo", garantiu o arcebispo. Mais adiante, disse que a possibilidade de extinguir a Fraternidade esteve em cima da mesa. "Mas decidimos esperar que o Ministério Público decidisse se tinha havido mesmo maus-tratos, para tomarmos medidas", disse.
O caso saltou para as páginas dos jornais em novembro de 2015, quando a Polícia Judiciária fez buscas no "convento" de Requião. Depois disso, disse D. Jorge Ortiga, a "preocupação" foi que as duas "noviças" que ficaram na Fraternidade estivessem bem. "Sem a irmã Arminda, diziam que a vida era de paz e calma", recorda.
Maria Arminda saiu então da Fraternidade, "com um saquinho de plástico e pouco mais, e foi para casa", notou a testemunha, que, questionada sobre se aquela arguida tinha saído por vontade própria, respondeu que foi por "ordem, ou sugestão com convicção", sua e do padre Milheiro. "Ela aceitou, contrariada", contou ao tribunal.
Segundo a mesma fonte, acrescentou ainda que as queixas de maus-tratos "só falavam" de Arminda, apesar de estarem em julgamento outras duas "freiras", além do padre Milheiro.
