"Não foi fácil tomar a decisão", mas o "medo e as dúvidas" perante os abalos que há uma semana fazem tremer a ilha de São Jorge, nos Açores, e o desejo de ter o filho "em segurança", falaram mais alto. E, na quinta-feira, Rosa Brasil, 36 anos, partiu com o marido, Paulo, e o pequeno Ivan, de três anos, rumo à ilha do Pico.
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O relato foi feito ao JN por Rosa, que ainda não conseguiu descansar. Para trás ficaram outros familiares, os amigos, a casa e os carros, nos quais até tinham previamente carregado os bens possíveis, para "caso a casa desabasse". "Primeiro está a vida. E, depois, um passo de cada vez", disse Rosa, perante a possibilidade de que o pior pesadelo se concretize e a ilha seja "destruída".
"Estou a dormir, acordo com pesadelos e sinto que a casa está a tremer. Isto já está tão metido no nosso inconsciente, que qualquer coisa parece que é um abalo", desabafou Rosa, admitindo que tem passado os dias "com o coração nas mãos" pelos que permanecem em São Jorge e mostrando-se grata pela solidariedade com que foi recebida. Ela e a família ficaram em casa de Cátia Goulart, da Irmandade do Espírito Santo da Companhia de Cima, em São João, entidade que tem pronto um salão para acolher cerca de meia centena de pessoas.
Velas está "deserta"
De acordo com fonte da Secretaria Regional da Saúde, já "deverão ter saído, à vontade, umas 2000 pessoas" de São Jorge, ilha que tem 8.373 habitantes, segundo dados do Censos 2021. A população de Velas (onde a intensidade é maior) que optou por ficar, seguiu "em debandada" para o município da Calheta, na parte da ilha que é considerada mais segura. E até nessa zona, há "pessoas a dormir em carros, porque não querem ficar dentro de casa". "Neste momento, Velas é uma vila quase deserta", mantendo-se apenas alguns funcionários públicos e elementos da proteção civil, descreveu a mesma fonte ao JN.
Desde o início da crise, a 19 de março, já foram registados cerca de 12.700 sismos na ilha de São Jorge, dos quais 187 foram sentidos pela população. Correspondem a "mais do dobro do que aqueles que foram registados em toda a região autónoma dos Açores em 2021", afirmou Rui Marques, presidente do CIVISA, citado pela Lusa.
Atualmente verifica-se uma "diminuição da energia libertada e, como tal, a magnitude média tem vindo a diminuir". A frequência dos sismos mantém-se "extremamente acima dos valores normais para os Açores" e continua a vigorar o alerta V4 (de um total de cinco), que indica possibilidade real de erupção.
O Estado-Maior-General das Forças Armadas adiantou, em comunicado, que está a preparar "o material e pessoal necessários para a ativação, em São Jorge, de um Ponto de Reunião e Irradiação de Desalojados". A operação segue hoje da ilha Terceira para a de São Jorge, no navio "Setúbal".
A Câmara de Comércio local alertou para as "dificuldades" que a situação provocará ao tecido económico, apelando à implementação de medidas de mitigação.
No local, investigadores estudam o fenómeno. "É uma oportunidade única ", adiantou à Lusa João Fontiela, da Universidade de Évora, que foi instalar 15 estações sísmicas.
Presidente da República visita hoje a ilha
O presidente da República visita hoje a ilha de São Jorge. Com a deslocação pretende "ver a situação" e transmitir "confiança à população, que não tem razões para estar preocupada ou sobressaltada. Os elementos disponíveis mostram que não há razões de gravidade que impliquem qualquer saída", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, citado pela Lusa.