Força da água abriu buraco em muro que sustenta bairro no Porto. Moradores pedem ajuda para recuperar casas danificadas pela chuva. Proteção Civil avança com trabalho na escarpa.
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Pelas paredes da casa de Rui Monteiro ecoam os gritos de Arminda Ferreira. A água bloqueia a entrada e encurrala a vizinha de 90 anos. Expressa o desespero com a voz. Tal como a casa no Bairro do Munhoz, nas Fontainhas, no Porto, também a vida da idosa está virada do avesso. Maria Teresa Almeida refugia-se com o marido, Rui, e o filho de 20 anos no sótão improvisado, enquanto a água cobre os móveis. "Dormi num colchão ensopado. Viver assim é horrível", desabafa Teresa, de 53 anos.
A nuvem negra afastou-se, mas os moradores temem que os danos que provocou sejam permanentes. Ainda ontem, o sentimento no bairro era de apreensão e receio quanto ao que poderia acontecer à ilha, dada a fragilidade dos solos provocada pelas chuvas.
Os terraços foram vedados pela Proteção Civil, mas as fitas já lá não estão. As roupas foram lavadas e estão agora a secar. "Disseram-nos para não vir para cá para cima. Se viéssemos, tínhamos de ser muito rápidos e se ouvíssemos um barulho ou qualquer coisa, tínhamos de fugir", menciona Rui Monteiro, 55 anos, junto ao armazém no fundo do terraço, onde no chão já é visível uma abertura. O desassossego de quem vive naquela zona das Fontainhas prende-se com um dos muros que sustenta aquela parte do bairro. A água retirou dezenas de blocos de pedras que formavam a parede. Está, agora, sustentada por vigas.
"Se calha de o muro ceder, isto vai junto. Os terraços e as casas", teme Rui Monteiro. Essa é também a principal preocupação da mulher, Maria Teresa.
Amadeu Faria, de 58 anos, acolheu a mãe, Arminda, e garante que a idosa não volta para as Fontainhas. No chão levantado, resta o lodo deixado pela chuva. "Só gostava de ter um lar onde ela pudesse ser acompanhada e estivesse em segurança", conta.
sarjetas e obra
Na escarpa decorriam ontem trabalhos para arranjar o que a água estragou. Na Rua de Gomes Freire, uns metros à frente da entrada para o Bairro do Munhoz, tentava retirar-se as pedras que se juntaram à entrada de uma conduta de água.
O vice-presidente da Câmara do Porto, Filipe Araújo, referindo a importância de "preservar a segurança das pessoas", relembra que "a zona das Fontainhas situa-se numa área quase de escarpa, percorrida por ribeiras". "Face a esta tormenta, uma ribeira saiu do seu leito. Isso está relacionado com escorrências da escarpa, e estamos a estudar formas de mitigar esses efeitos", assegura.
Quanto à enxurrada que assolou a Baixa do Porto - que já voltou à normalidade -, indica que "com a obra do metro [de construção da Linha Rosa] foram reduzidos o número de sarjetas com capacidade de inserção, até pela alteração de passeios". Preveem-se modificações.
Mas enquanto o desvio do rio da Vila não estiver operacional, "há desvios e alterações que têm de ser produzidas na rede atual", nota. Uma estrutura nova criada pela obra também poderá ter influenciado. A Metro não faz mais comentários, aguardando uma avaliação do Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
Apoio de 15 mil euros a cada freguesia em Gaia
Para reparar os danos nas estradas causados pelo mau tempo, a Câmara de Gaia definiu um apoio monetário até 15 mil euros para cada freguesia. O autarca Eduardo Vítor Rodrigues admitiu "reforçar" esse valor caso seja necessário. Também disse que Gaia vai entregar na CCDR-N, "até à próxima quinta-feira", a estimativa dos prejuízos provocados pela chuva. As contas englobam danos no comércio, em habitações e no espaço público.
Reaberta a Avenida Gustavo Eiffel
A Avenida Gustavo Eiffel, no Porto, foi ontem reaberta ao trânsito, cortado havia seis dias devido a uma derrocada de pedras de grandes dimensões. A circulação faz-se de forma alternada, com recurso a semáforos, numa faixa de rodagem.
Caudal estabiliza no Peso da Régua
O caudal do rio Douro estabilizou ontem de manhã no Peso da Régua, após ter subido cerca de quatro metros, em relação ao normal, durante a madrugada. Segundo Rui Lopes, comandante dos bombeiros locais, o rio atingiu o nível máximo da última inundação, registada há duas semanas, galgando a zona do cais. Os acessos à parte ribeirinha e à ecopista estão cortados.
Circulação reposta na Linha do Douro
Foi restabelecida a circulação de comboios entre as estações de Aregos e Ermida, na Linha do Douro, que havia sido suspensa após derrocada de terras, a terceira nas últimas semanas, revelou a Infraestruturas de Portugal.
789 ocorrências foram registadas pela Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil entre as 23 horas de sexta-feira e as 7.30 de ontem, 251 delas reportadas na Área Metropolitana do Porto.
Sacos de areia
Em algumas frentes de obra da Metro do Porto foram colocados grandes sacos de areia para conter o deslocamento de quaisquer materiais, no caso de a cidade voltar a ser atingida por chuva intensa.
Indemnizações
Perante a enxurrada de sábado, que entrou por vários estabelecimentos e causou danos, o vice-presidente da Câmara do Porto diz ser "prematuro" falar em eventuais indemnizações.