<p>Santos Silva admite que o PS ainda pode chegar a um entendimento com Cavaco Silva sobre a lei eleitoral dos emigrantes e garante que a palavra de Cavaco Silva "conta sempre muito".</p>
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O PS é o "grande partido popular da Esquerda democrática"?
Nos termos da respectiva Declaração de Princípios, sim. É um grande partido e sê-lo-á enquanto beneficiar do apoio do eleitorado; é um partido popular, por não ser de um nicho; e é um partido da Esquerda democrática em Portugal representada pelo socialismo democrático.
Manuel Alegre parece que não se revê nessa terminologia.
A grande vantagem do PS é que representa uma área social e política tão vasta que existem várias formas de nomear a mesma coisa.
Tem um prazer especial em "malhar na Direita"?
Tenho gosto pelo debate político que travo com os meus adversários. A expressão "malhar" é forte, mas é usada em sentido figurado e num determinado contexto de debate político. É uma boa praxe da Democracia portuguesa. Da mesma forma que, quando o PCP caracterizou a proposta do Código do Trabalho como uma "declaração de guerra" do Governo aos trabalhadores portugueses, não queria dizer que o Governo fosse fuzilar pessoas. Da mesma forma que o BE, na campanha das europeias, usou cartazes a dizer "Estás farto? Vota em quem lhes bate forte", certamente que não estava a sugerir que ia bater com um rolo da massa nos políticos do então Governo de Direita. Não vale a pena fingirmo-nos de virgens ofendidas.
Não citou o PSD nem o CDS-PP.
A presidente do PSD disse num congresso do PSD dos Açores que José Sócrates é o "coveiro da pátria". Eu usei o verbo "malhar" no sentido de bater no cereal para debulhar e debulhar significa libertar o grão das impurezas para depois fabricar o pão. Se calhar não devia aplicar o verbo "malhar" à actual liderança da Direita ou aos partidos que se gostam de dizer à esquerda do PS porque não se percebe que grão pode sair dali para alimentar os portugueses.
Admite que possam ocorrer mais nacionalizações?
A nacionalização do BPN foi uma situação limite para resolver de imediato um problema de risco de cessação de pagamentos, risco dos depositantes verem as suas poupanças em perigo e risco de contaminação para todo o sistema financeiro. Se houver circunstâncias semelhantes, estou certo de que o Governo não hesitará em responder com os instrumentos legais que estão ao seu dispor. Nenhum governo poderá afirmar que não usará o instrumento da nacionalização.
O que significa quando um histórico como Edmundo Pedro denuncia o "clima de medo" que se vive no PS?
O meu camarada Edmundo Pedro já teve oportunidade de esclarecer que se sentia até indignado pela forma como foram interpretadas as suas palavras. Apenas se limitou a dizer que, entre membros do partido que estavam no aparelho do Estado, tinha encontrado alguns que lhe disseram que, concordando com a moção, não a queriam subscrever por não ser a moção do secretário-geral. Ele disse, e muito bem, que não se trata de uma atitude típica do PS.
Ele foi claro: "Há medo no PS".
A expressão relaciona-se com a atitude que encontrou em algumas pessoas e denunciou que é um comportamento contraditório com o PS. Estou de acordo.
O senhor reagiu a essas declarações noutros termos e Alegre chamou-lhe estalinista.
Há mais problemas além desses.
O Freeport resulta de uma "campanha negra" ou é um "assunto de Estado"?
Se fosse uma campanha negra envolvendo o primeiro-ministro já seria um assunto de Estado. Nenhuma democracia pode aceitar que se desenvolvam campanhas negras tomando como alvo os principais responsáveis do país. A alternativa que colocou não está correcta.
Não fui eu: o primeiro-ministro falou em "campanha negra" e o presidente da República em "assunto de Estado". Há uma dicotomia.
Não há dicotomia nenhuma e, se me permite o comentário, a dicotomia é sua. Primeiro: há um caso que está sob investigação judicial que procura apurar se houve qualquer irregularidade cometida seja por quem for no processo que conduziu ao licenciamento do Freeport. Segundo: há umas semanas, tentou sugerir-se que, na aprovação por parte do Ministério do Ambiente da avaliação ambiental e no processo que levou à revisão da ZPE de Alcochete, houve qualquer tipo de irregularidade administrativa. Já se percebeu que não houve e que a revisão da ZPE não teve nenhuma influência no processo de licenciamento. Terceiro: sabemos que, em fins de 2004, princípios de 2005, realizou--se uma operação de contornos políticos que procurou associar o então candidato a primeiro-ministro José Sócrates a alegadas ilicitudes associadas com o "caso Freeport". Sabemos agora as condições em que foram fabricadas as denúncias supostamente anónimas que levaram a que fosse produzido um documento que, violando o segredo de Justiça, foi publicado em "O Independente" dois dias antes das eleições de 2005. Sabemos quem são as pessoas associadas a essa operação política e que foram e são adversários políticos do PS. Foi com base nessa alegada denúncia anónima que foram pedidas informações pelas autoridades inglesas e foi com essa base que apareceu a carta rogatória dirigida às autoridades portugueses.
Onde é que está a "campanha negra"?
Consiste no conjunto organizado e sequencional no tempo de fugas de informação e violações do segredo de Justiça que têm por objectivo criar uma nova operação de suspeição em redor do primeiro-ministro. Consiste no facto de essa operação envolver até acusações falsas envolvendo a família mais próxima do primeiro-ministro. Consiste em essa operação ter por base as tais denúncias alegadamente anónimas.
Quem são os responsáveis pela campanha negra: adversários políticos do primeiro-ministro?
Sei o que aconteceu em 2005 e sei do silêncio que se vive em 2009 sobre factos que foram julgados.
A quem é que aproveita recuperar essa campanha?
Não sei responder a essa pergunta. Por isso uso a expressão poderes ocultos.
O Governo não tem poderes para investigar esses poderes ocultos?
Não tem poderes para dar ordens ao Ministério Público e à Polícia Judiciária e deve respeitar a autonomia dessas autoridades.
Isto está sempre a acontecer ao PS. A cabala da Casa Pia em 2003, a campanha negra de 2005 e os poderes ocultos de 2009.
Em 2003, apurou-se uma parte importante da verdade: aqueles que foram crucificados na praça pública não tinham absolutamente nada a ver com os crimes infames de que foram acusados. Sabemos o que aconteceu em 2005 porque o caso foi julgado.Em 2009, a procuradora Cândida Almeida já afirmou que solicitou uma investigação.
A quem é que importam as cabalas contra o PS?
Não tenho jeito para romances policiais.
Não é romance: é política.
Estas operações têm evidentes contornos políticos, mas o PS não é o único partido que se pode queixar. Vi em directo nas televisões uma busca ao escritório de Luís Nobres Guedes. Alguém avisou os jornalistas.
O MP ou a PJ?
Não sei.
A Democracia convive bem com esse ambiente de suspeição?
A Democracia tem de derrotar esse ambiente de suspeição. Vou medir as palavras do que vou dizer: já assisti, em 2003 e 2004, a uma tentativa de decapitação do PS e essa tentativa frustrou-se; o PS ganhou as eleições europeias de 2004 e ganhou as eleições legislativas de 2005.
Os poderes ocultos estão a tentar novamente decapitar o PS?
Está em curso uma tentativa de assassinato político e moral de José Sócrates.
A investigação do MP deve ser célere a apurar se há ou não políticos envolvidos no "caso Freeport"?
A sua pergunta tem um pequeno problema.
Todas têm, não é?
Claro, mas a acreditar no MP, não se anda a investigar se há políticos envolvidos no "caso Freeport". O MP já disse que o primeiro-ministro não é suspeito, nem está sob investigação.
O Estatuto dos Açores marcou uma nova fase nas relações entre o presidente da República e o Governo?
Do ponto de vista do Governo, não.
O PS está começar a separar as águas?
Sempre que o presidente devolve diplomas ao Parlamento, o Grupo Parlamentar do PS tem dito que ponderará as razões invocadas. A palavra do presidente conta sempre e tem-nos ajudado muito a aperfeiçoar e a esclarecer diplomas que podiam parecer inequívocos.
Até onde o PS admite ouvir a palavra do presidente no caso do voto dos emigrantes?
Trata-se de uma lei votada na Assembleia da República, tal como o Estatuto dos Açores, votada pelo PS, PCP, BE e PEV que o presidente entendeu não promulgar. O PS vai considerar com todo o cuidado as razões aduzidas pelo presidente e tentará encontrar formas consensuais de lhes responder.
Para evitar novo conflito?
Não há conflito.
Houve. O presidente foi claro.
É um desacordo.
Preocupa-o que surja um novo partido que reúna o BE, sindicalistas ex-PCP e os votos de Alegre no PS?
Seria um factor de preocupação para a estabilidade política em Portugal, mas considero que esse cenário não se coloca.
Por que é que seria um factor de instabilidade?
Os portugueses serão chamados a responder a duas perguntas essenciais no Outono: Quem é que querem que lidere o país neste momento? Querem ou não que quem lidera o país tenha condições de estabilidade política para liderar? Não vejo outra maneira de garantir a estabilidade política de que o país precisa do que a renovação da maioria do PS.
É a reunião dessas forças que pode comprometer essa ambição do PS?
Não sou analista político.
As suas respostas anteriores são nesse sentido.
Os indicadores demonstram, há meses, que o PS está consistentemente na fronteira dos 40 por cento. A maioria está ao alcance.
Portugal é ingovernável sem uma maioria absoluta?
O país é sempre governável e ninguém tem autoridade para fazer chantagem sobre o eleitorado. Primeiro: queremos renovar a maioria. Segundo: aceitaremos qualquer resultado do eleitorado.
O PS admite governar em minoria, formar uma coligação pós-eleitoral ou ratificar acordos parlamentares?
Não existe a figura do amuo quando o povo não satisfaz as pretensões dos partidos.
Qual é o calendário eleitoral preferido?
As eleições europeias são um caso pacífico. Quanto às eleições autárquicas e legislativas, há tecnicamente várias soluções possíveis, mas o PS e outros partidos consideram que as eleições locais e as eleições nacionais não devem realizar-se no mesmo dia.