Penalista considera que crime de desobediência imputado a Rui Pedro Soares tem fundamento
O professor de Direito Penal Fernando Silva considera que a queixa que vai ser apresentada pela comissão parlamentar de inquérito do "caso Governo/TVI" pelo crime de desobediência contra Rui Pedro Soares "tem fundamento".
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Em declarações à agência Lusa, Fernando Silva considera que a acusação de crime de desobediência "tem fundamento" porque Rui Pedro Soares não está a ser ouvido na comissão de inquérito "na condição de arguido".
"Tem fundamento na medida em que ele, objectiva e subjectivamente, praticou um ato que corresponde a uma desobediência, mas a verdade é que esta está justificada, portanto, em meu entender, o ato não é ilícito", explicou.
O ex-administrador da PT recusou hoje responder a perguntas dos deputados na comissão de inquérito alegando ter o estatuto de arguido num processo judicial (caso Face Oculta/Taguspark) e ter, por isso, "direito ao silêncio".
Segundo o professor de Direito Penal Fernando Silva, a decisão de não responder às perguntas dos deputados é "legítima estratégia de defesa" de Rui Pedro Soares.
"Os arguidos podem remeter-se ao silêncio, responder apenas ao que entenderem ou mesmo não responder com verdade", explicou à Lusa, destacando, contudo, o facto de Rui Pedro Soares ter "transposto o estatuto de arguido do processo crime" para a comissão onde está "como testemunha".
Os deputados alegam, precisamente, que Rui Pedro Soares era obrigado a responder porque, na comissão parlamentar, não tem estatuto de arguido, pelo que cometeu um crime de desobediência.
"Agora compete ao Ministério Público fazer a apreciação para perceber até que ponto é justificada ou não a sua conduta, apesar de me parecer que sim, porque as declarações que prestar podem influenciar o inquérito em que é arguido", afirmou Fernando Silva.
A comissão de inquérito ao chamado caso Governo/TVI decidiu hoje enviar um ofício ao presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, para que notifique o procurador geral da República do "crime de desobediência" em que terá incorrido Rui Pedro Soares por ser recusar a responder às perguntas dos deputados invocando a sua situação de arguido no processo Face Oculta/Taguspark.
O requerimento foi aprovado no final da reunião com a abstenção do PS e do presidente da comissão, Mota Amaral, tendo determinado a comunicação a Jaime Gama da recusa de Rui Pedro Soares para que dê seguimento da queixa à Procuradoria Geral da República.
O crime de desobediência (artigo 348 do Código Penal) é punido com uma pena de prisão até um ano, ou uma pena de multa até 120 dias, se for considerado desobediência simples. No caso de desobediência qualificada, a moldura penal é uma pena de prisão até dois anos ou uma multa até 240 dias.
Criada por requerimento potestativo do PSD e do BE, a comissão de inquérito parlamentar tem como objecto "apurar se o Governo, direita ou indirectamente, interveio na operação conducente à compra da TVI e, se o fez, de que modo e com que objectivos".
Além disso, a comissão visa "apurar se o primeiro ministro disse a verdade ao Parlamento, na sessão plenária de 24 de Junho de 2009", quando referiu que não tinha sido informado sobre o plano.
Entre as 21 pessoas que a comissão de inquérito quer ouvir está Rui Pedro Soares, ex-administrador da PT, que o Ministério Público acusou de corrupção passiva no processo que investigou um contrato da empresa Taguspark com o ex-futebolista Luís Figo e que surgiu com base em escutas telefónicas do processo Face Oculta, que investiga alegados casos de corrupção relacionados com empresas privadas e do sector empresarial do Estado.