O tablet que Inês Nunes, 11 anos, de Algés, tanto queria fez parte da lista de compras para o novo ano letivo, graças ao excelente desempenho escolar que lhe proporcionou ser uma das vencedoras da iniciativa "Regresso às Aulas", com um vale de compras de 500 euros oferecido pela Staples. "Fiquei muito feliz, mal soube que tinha sido selecionada pensei logo em comprar um tablet", diz a aluna.
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Mas, o carrinho de compras tinha outros produtos, como a jovem a seguir enumera: "Material escolar, uma mochila, um refrigerador para portáteis, um disco externo, bolas de esferovite para fazer um trabalho e calculadora".
E até há uma história por detrás da compra da mochila que escolheu. "Viemos à loja uns dias antes da visita para vermos bem o que iriamos levar e como já era a única mochila do modelo com mochos que havia, pedi aos senhores da Staples para me fazerem o favor de a guardar", conta Inês, para quem este prémio é um incentivo para continuar a ser boa aluna.
"Sempre foi a melhor"
No entanto, o pai Nuno Picardo, de 49 anos, diz que não é preciso fazer nada para estimular a filha a estudar. "Antes de chegar a casa, já fez os trabalhos. Sempre foi a melhor aluna da escola", continua o progenitor, aproveitando para elogiar a ação conjunta do Jornal de Notícias, Staples e Pingo Doce. "É excelente, devia haver mais empresas a aderir, porque o país tem muito mais pessoas em situações difíceis, mas as crianças não conseguiram tão bons resultados", anota o encarregado de educação.
Quanto a Inês, embora tenha boas notas a todas as disciplinas, a preferida é Educação Tecnológica, onde aprende a "desenhar e construir coisas com papel". Apesar de gostar de trabalhos manuais, a jovem de Algés gostaria de enveredar pela Medicina Veterinária como atividade profissional no futuro, pelo "amor" que tem aos animais.
"É o essencial e tudo o que é supérfluo está cortado"
Nuno Picardo diz que, face à situação atual, os vales Pingo Doce foram providenciais. Com um rendimento mensal de cerca de 300 euros, os vales de compras do Pingo Doce foram para Nuno Picardo como "pão para a boca". "Na situação difícil em que estamos foi uma lufada poder comprar as coisas que a Inês estava habituada e que agora não podia comprar", adianta o progenitor, que teve de "reduzir as despesas ao mínimo".
"É o essencial, nada em excesso e tudo o que é supérfluo está cortado", acrescenta Nuno Picardo, reconhecendo que o corte foi sendo gradual nos últimos três anos. Por isso, vai aproveitar os vales Pingo Doce para adquirir produtos alimentares, algum material escolar em falta e roupa para as duas crianças. O pai de Inês Nunes não consegue quantificar quanto gasta em alimentação. "Em função do rendimento e das ajudas que recebo é que vou conseguindo fazer as compras", explica.
"Quadro real"
No entanto, esta é uma situação nova na vida de Nuno Picardo. "Sempre vivi acima do estável e deparei-me com uma situação pela qual nunca tínhamos passado, mesmo com as convulsões dos últimos 40 anos", confessa o vendedor de automóveis, que após ter ficado desempregado há dois anos, e com um divórcio pelo meio, teve de deixar os luxos para trás.
Este é o "quadro real" da sociedade portuguesa, que segundo o pai de Inês "mais real seria se as pessoas perdessem a vergonha". "Há muita pobreza envergonhada que não vem cá para fora, de pessoas que mantêm uma aparência que já não existe. Eu já não posso mantê-la, por isso desisti", finaliza.