(Em atualização) João Cabral, consultor do Freeport, afirmou esta quinta-feira no Tribunal do Barreiro que foram os advogados da Gandarez e Antunes que propuserem aos arguidos conseguir a aprovação do outlet por dois milhões de libras, face ao chumbo iminente do projeto, contrariando a versão apresentada em julgamento pelos advogados dos visados.
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"Era uma proposta descabida e ficamos indignados", disse João Cabral, consultor do grupo Freeport, que trabalhou com a Smith & Pedro, realçando que ainda "que toda a gente queria ganhar dinheiro com o Freeport" e que o projeto custou mais dinheiro do que fora previsto devido "a pessoas que populavam em torno, pessoas até com responsabilidades neste país que nos tentaram prejudicar".
A testemunha, que na altura trabalhava com os arguidos Charles Smith e Manuel Pedro como consultores do empreendimento, confirmou que na noite de 5 de dezembro de 2001 foram chamados de urgência ao escritório de advogados de Albertino Antunes, onde, através do advogado José Gandarez, lhes foi comunicado que o chumbo do projeto Freeport estava iminente e seria conhecido dentro de dias, mas que eles conseguiriam inverter a situação caso os ingleses disponibilizassem dois milhões de libras.
João Cabral relatou que a Smith & Pedro exigiu ao escritório de advogados que fizesse a proposta por escrito para ser enviada aos ingleses, muito embora tenha ficado em "estado de choque" com a sugestão dos advogados, cujo porta-voz foi José Gandarez.
A proposta chegou ao escritório da Smith & Pedro nessa mesma madrugada, mas a verba exigida para garantir a aprovação do projeto baixara para 1,250 milhões, não sabendo a testemunha precisar se eram libras ou escudos.
João Cabral disse desconhecer de que forma aquele escritório de advogados sabia antecipadamente do chumbo do projeto, cuja volumetria e previsão da construção de um hotel, casino, discoteca e bowling dificultava a aprovação.
A testemunha admitiu em tribunal que "só quando a Câmara Municipal de Alcochete (CMA) mudou de cor (CDU para PS) é que se conseguiu licenciar o Freeport".
O tribunal inquiriu também o arquiteto Paulo Miguel Perlouro, do ateliê Promontório, que disse não ter uma explicação para o facto de em finais de 2001 ou início de 2002 a sua equipa, muito experiente na conceção de centros comerciais, ter sido afastada do projeto pelos ingleses do Freeport a favor do atelier de arquitetos Capinha Lopes, que até então não tinha credenciais naquele tipo de projetos.
Recordou que, na altura, não se preocupou muito com os motivos que levaram a Freeport a optar pela Capinha Lopes, já que a sua prioridade era a de que os ingleses pagassem as faturas acumuladas durante meses.
A sessão voltou a ficar marcada pelas discordâncias entre o procurador Vitor Pinto e a advogada de defesa dos arguidos, Paulo Lourenço, sobre os documentos que podem ser exibidos às testemunhas, com a causídica a queixar-se de que o Ministério Público está a extravasar o objeto do processo (crime de tentativa de extorsão).
O coletivo de juízes decidiu, contudo, dar maior latitude ao julgamento, justificando que o tipo de criminalidade económica em causa aconselha que para o apuramento da verdade sejam mostrados tais documentos.
O processo Freeport teve na sua origem suspeitas de corrupção e tráfico de influências na alteração à Zona de Proteção Especial do Estuário do Tejo e licenciamento do espaço comercial em Alcochete quando era ministro do Ambiente José Sócrates, que veio mais tarde a ser primeiro-ministro.
Os dois arguidos - Charles Smith e Manuel Pedro - respondem por tentativa de extorsão.
*Com Agência Lusa