O Tribunal Judicial de Leiria absolveu, esta quarta-feira, o ex-jornalista António Laranjeira dos crimes de difamação e violação do segredo de justiça, anulando, sete anos depois, uma sentença do mesmo tribunal.
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"Fez-se justiça, finalmente", disse à saída do tribunal António Laranjeira, agora consultor de comunicação, sublinhando que "quiseram transformar um problema de costumes num processo político com o objetivo de condicionarem" aquela que era então a sua actividade como jornalista.
Em causa esteve um artigo publicado em 2000, no semanário de que era director, o "Notícias de Leiria". A notícia referia-se ao arquivamento, pelo Ministério Público, de um processo em que um médico, fundador do PSD e na altura presidente da Assembleia Municipal de Leiria, era indiciado por abusos sexuais sobre uma paciente, no seu consultório.
Em 2004, o Tribunal de Leiria considerou-o culpado de dois crimes de difamação agravada e violação do segredo de justiça. António Laranjeira recorreu ao Tribunal da Relação de Coimbra, ao Supremo Tribunal de Justiça e ao Tribunal Constitucional, mas todos mantiveram a decisão da 1.ª instância, tendo sido obrigado ao pagamento de uma indemnização ao queixoso no valor de cinco mil euros.
Em 2010, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem deu-lhe razão e condenou o Estado português a pagar-lhe uma indemnização de cerca de 8703 euros por "entrave injustificado" à liberdade de expressão.
Nesse mesmo ano, o Supremo Tribunal de Justiça autorizou a revisão da sentença proferida e confirmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra com fundamento na sentença emitida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
O juiz que julgou o caso, esta quarta-feira, sublinhou, durante a leitura da sentença, que se "impõe dar prevalência ao exercício da liberdade de expressão" e que "assim se assegura o interesse de uma sociedade democrática em manter o máximo de exercício de liberdade".
O juiz sustenta que "o tempo teológico findou há muito" e que "num Estado democrático de Direito (...) impõe-se não a moralidade, mas a ética da discussão, da crítica".
Realça que "é no mercado (...) que podem confluir factos inverídicos relatados pela imprensa, juízos menos abonatórios realizados por jornalistas, os quais formam a maturação da liberdade comunitária". O juiz conclui que "caso se inibisse a imprensa de relatos, de crónicas, de 'investigações' (...) Perderíamos todos muito mais".
A decisão, para além de absolver António Laranjeira dos crimes condenado desde 2004, obriga o médico a devolver 1672 euros, entretanto pagos a título de indemnização.
O advogado do médico, Rodrigo Santiago, disse à agência Lusa que iria analisar a sentença e que só depois decidiria com o seu cliente sobre um eventual recurso.