O Conselho de Ética para as Ciências da Vida quer mais uniformização e transparência por parte dos hospitais na escolha de medicamentos, para poupar custos e aumentar a igualdade no tratamento de doentes. O esclarecimento do Conselho surge na sequência da polémica surgida com um parecer em que era sugerido o racionamento dos medicamentos mais caros.
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Esta é a base da fundamentação ética para um modelo de financiamento de medicamentos para Sida, cancro e artrite reumatóide, proposto ao Ministério da Saúde pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV).
Em conferência de imprensa, este órgão esclareceu os pressupostos e o alcance do parecer, que gerou polémica e posições extremadas ao ser interpretado como um documento que sugeria o racionamento dos medicamentos.
"Racionamento é um termo que no parecer é usado em relação aos custos e que tecnicamente é benigno. Trata-se de otimizar recursos racionalmente. O parecer é feito para que não haja nunca falta do essencial", afirmou aos jornalistas o presidente do CNECV, Oliveira da Silva.
No fundo, é proposto que as decisões dos hospitais quanto aos medicamentos a escolher sigam um modelo, que privilegia a escolha dos "mais baratos dos melhores e não os melhores dos mais baratos".
"O que muda é a transparência no processo de decisão. Não é eticamente sustentável que as administrações hospitalares decidam entre quatro medicamentos parecidos e escolham um deles sem o explicar, nem é desejável que dois hospitais em duas regiões do país deem medicamentos diferentes a doentes com a mesma patologia", sublinhou Oliveira da Silva.
Assim, o modelo que é proposto tem três fases, disse Ana Sofia Carvalho, do CNECV, explicitando-as.
Na primeira fase, clínicos, investigadores e grupos de farmácia e terapêutica escolhem os melhores fármacos para determinada doença.
Na segunda, as administrações hospitalares, perante os melhores fármacos, avaliam os que têm melhor custo/benefício e elaboram uma lista com os melhores (mais baratos dos melhores). Nesta fase participam também as associações de doentes.
A última fase é a da decisão, em que o Ministério da Saúde tem a última palavra.
Questionado sobre uma afirmação em que alegadamente terá estabelecido uma relação custo/benefício entre o custo de medicamentos e o tempo de vida do doente, Oliveira da Silva respondeu: "Nunca diria uma estupidez dessas".
O presidente do CNECV explicou ter considerado que "eticamente é legítimo discutir isso", à semelhança do que acontece em muitos outros países, mas sublinhou que, apesar de defender o debate, nem sequer concorda com essa ideia de base.
Além disso, acrescentou que se um medicamento inovador tiver eficácia comprovada, não pode ser recusado a doente nenhum e sublinhou que o CNECV considera ilegítimo que se faça escolha com base na idade dos doentes.
"Nunca esteve na ideia que o parecer pudesse ser por idades", disse Oliveira da Silva, afirmando que o documento foi aprovado por unanimidade.
Ana Sofia Carvalho acrescentou ainda que o CNECV se sentiu "muito honrado" por ter sido chamado a pronunciar-se sobre um modelo em que, pela primeira vez e em contexto de crise, a contenção seja feita com base em princípios éticos e maximizando a dignidade do doente.
"Ficámos honrados por poder apresentar um modelo em que, com o mesmo dinheiro, se diminuam as desigualdades e se melhore a dignidade das pessoas".