O perdão de penas e de multas, que será concedido pelo Governo a propósito da vinda do Papa Francisco a Portugal, pode ser revogado, caso o jovem amnistiado cometa crimes ou "infrações dolosas" nos próximos três anos. A proposta de lei, aprovada esta terça-feira em Conselho de Ministros, já entrou no Parlamento.
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O Governo aprovou, na segunda-feira, uma proposta de lei que prevê o perdão de um ano nas penas de prisão até oito anos, excluindo criminalidade muito grave e crimes de ódio e de discriminação, e a amnistia de multas até mil euros, exceto as contraordenações resultantes de infrações praticadas por "influência de álcool ou de estupefacientes". Esta medida abrange os ilícitos praticados até à meia-noite do dia 19 de junho e destina-se aos jovens entre os 16 e os 30 anos.
No entanto, o diploma, que já deu entrada na Assembleia da República, especifica que a clemência será concedida sob condição do jovem amnistiado "não praticar infração dolosa nos três anos subsequentes à data da entrada em vigor da presente lei". Se não cumprir esta regra, o perdão é revogado. "À pena aplicada à infração superveniente, acrescerá a pena ou parte da pena perdoada", explica o Executivo, especificando que, nas situações em que o condenado está obrigado ao pagamento de uma indemnização ao ofendido, a amnistia só é concedida se tiver feito a reparação devida do lesado.
"Sempre que o lesado for desconhecido ou quando não for encontrado ou ocorrendo outro motivo justificado e se a reparação consistir no pagamento de quantia determinada, considera-se satisfeita" a reparação, "se o respetivo montante for depositado à ordem do tribunal", determina ainda. Nos casos em que há processos pendentes, nomeadamente em Tribunal, os casos são extintos, mas os jovens terão de pagar as taxas de justiça.
Prisões preventivas reavaliadas
As prisões preventivas também podem ser reavaliadas ao abrigo deste regime. Na proposta de lei, estabelece-se a possibilidade de, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor da legislação e nos processos cujos ilícitos foram praticados até à meia-noite do dia 19 de junho por jovens até aos 30 anos, reanalisar os "pressupostos da prisão preventiva, poderando-se" a revogação "face à pena previsível em consequência da aplicação" da clemência. Este "reexame" terá de ser requerido pelo arguido, pelo Ministério Público ou "oficiosamente".
As ministras da Justiça e Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, que subscrevem o diploma, admitem a recusa da amnistia. Os potenciais beneficiários podem rejeitar o perdão "no prazo de 10 dias" após a entrada em vigor da lei. Mas não podem mudar de ideias: "A declaração do arguido é irretratável".
Nos processos com despacho de pronúncia ou já com dia para audiência de julgamento e cujo procedimento criminal seja extinto por força deste regime, o "ofendido" pode requerer o seu prosseguimento "apenas para fixação da indemnização cível". Contudo, terá de solicitá-lo no prazo de 10 dias, "contados a partir do trânsito em julgado da decisão".
Clemências dadas noutras visitas
O Governo sublinha que estas medidas de clemência são habituais no quadro de visitas do papa a Portugal e justifica-se perante um pontificado fortemente marcado pela exortação da reinserção social dos presos.
"Considerando a realização em Portugal da JMJ em agosto de 2023, que conta com a presença do Papa Francisco, cujo testemunho de vida e de pontificado está fortemente marcado pela exortação da reinserção social das pessoas em conflito com a lei penal, tomando a experiência pretérita de concessão de perdão e amnistia aquando da visita a Portugal do representante máximo da Igreja Católica Apostólica Romana, justifica-se adotar medidas de clemência focadas na faixa etária dos destinatários centrais do evento", ou seja, os jovens até ao 30 anos, justifica o Governo, no diploma a que o JN teve acesso.
Nesse sentido, as ministras da Justiça e Adjunta e dos Assuntos Parlamentares promovem um "regime de perdão de penas e de amnistia que tenha como principais protagonistas os jovens. Especificamente, jovens a partir da maioridade penal, e até perfazerem 30 anos, idade limite da Jornada Mundial da Juventude". O perdão aplica-se, então, a penas até oito anos de encarceramento, reduzindo um ano de prisão, incluindo nos casos de prisão domiciliária.
Também abarca "penas de multa até 120 dias, em substituição de penas de prisão", a "prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa", a "pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição" e as "penas de substituição". Nos casos em que o jovem tenha sido condenado a penas sucessivas, a clemência "incide apenas sobre o remanescente do somatório dessas penas".
A amnistia de multas tem como limite máximo as coimas inferiores a mil euros. Também serão perdoadas as infrações e os ilícitos "disciplinares militares que não constituam, simultaneamente, ilícitos penais não amnistiados pela presente lei e cuja sanção aplicável não seja superior a suspensão ou prisão disciplinar", assim como as infrações penais cuja pena não seja superior a um ano ou a 120 dias de multa.