Tanto o PS como o Governo defendem que a reposição salarial e a eliminação da sobretaxa de IRS seja gradual, mas os socialistas entendem que pode ser feita mais depressa do que o Executivo
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Os economistas do partido de António Costa e o Executivo liderado por Pedro Passos Coelho entendem que os cortes salariais e a sobretaxa de IRS são para acabar na próxima legislatura, mas com ritmos diferentes: o PS quer repor os salários em dois anos e acabar com a sobretaxa em 2017 e o Governo considera que essas duas medidas só são possíveis em 2019.
O PS criou um grupo de trabalho para definir um cenário macroeconómico para a próxima legislatura, em que são propostas várias medidas até 2019 e, considerando essas políticas, traçou uma trajetória de crescimento e de evolução orçamental.
O documento com chancela do PS surge cinco dias depois de o Governo de coligação PSD/CDS-PP ter apresentado o Programa de Estabilidade e o Plano Nacional de Reformas 2015-2019.
A devolução dos cortes salariais aos trabalhadores do Estado e o fim da sobretaxa são as medidas centrais nas duas propostas, que incluem ainda outras medidas.
Entre as políticas previstas no relatório "Uma década para Portugal", liderado pelo economista e quadro do Banco de Portugal Mário Centeno, estão ainda a redução do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) da restauração para 13% em 2016 e a reposição dos mínimos sociais aplicados ao Rendimento Social de Inserção, ao Complemento Solidário para Idosos e ao Abono de Família.
Já do lado do Executivo, foi proposta a redução para metade da Contribuição Extraordinária do Setor Energético (CESE) em 2016 e a sua extinção até 2018.
Além disso, está ainda previsto o desaparecimento do Imposto Municipal sobre as Transmissões onerosas de Imóveis (IMT) em 2019, passando a transmissão de imóveis a ser sujeita ao pagamento de Imposto de Selo.
Eis uma comparação entre as medidas que o Governo inclui no Programa de Estabilidade e que o grupo de trabalho do PS apresentou esta terça-feira:
Reposição de cortes salariais
O grupo de trabalho do PS propôs a reversão dos cortes salariais dos funcionários públicos em 2016 e em 2017 a 40%/ano.
No Programa de Estabilidade, apresentado na semana passada, o Executivo propôs a reposição gradual, a um ritmo de 20% por ano, dos salários na função pública, de modo a serem pagos a 100% em 2019.
Sobretaxa em sede de IRS
O grupo de trabalho de economistas do PS sugere a eliminação gradual da sobretaxa de IRS, conduzindo à sua extinção em 2017.
Já o Governo pretende que a redução da sobretaxa de 3,5% em sede de IRS "seja distribuída no horizonte" do Programa de Estabilidade e do Plano Nacional de Reformas, conduzindo "ao seu desaparecimento em 2019".
Taxa Social Única (TSU)
O PS sugere a redução da contribuição para a Segurança Social paga pelo trabalhador de forma gradual até 2018, passando a TSU dos atuais 11% para os 9,5% em 2016, os 8% em 2017 e os 7% em 2018.
No entanto, os economistas admitem que, a partir de 2019, a taxa possa aumentar "ao ritmo de 0,5 pontos percentuais" ao ano, sendo "reposta na totalidade em 2026". Esta medida é aplicada apenas a trabalhadores com menos de 60 anos.
O cenário macroeconómico do PS prevê também uma redução da taxa contributiva dos empregadores para a Segurança Social em quatro pontos, mas com caráter estrutural e apenas para os contratos sem termo.
Por sua vez, o Governo admite a possibilidade de haver uma redução dos custos de trabalho para as empresas nos próximos quatro anos, sem uma compensação para essa perda de receita.
No entanto, não há, do lado do Executivo, uma proposta concreta para a descida da TSU nem no Programa de Estabilidade, nem no Programa de Reformas, tendo a ministra das Finanças afirmado que esta questão não foi discutida.
Pensões
Os socialistas sugerem um corte entre 1,25% e 2,6% nas pensões que serão pagas a partir de 2027 para financiar a descida da TSU, garantindo que a medida "não tem qualquer impacto nos atuais pensionistas".
De fora deste aumento futuro ficam as pensões mínimas, que oscilam entre os cerca de 200 euros e os 400 euros.
Já o Governo pretende reduzir a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES), que atualmente se aplica às pensões acima de 4.611,42 euros, para metade no próximo ano e eliminá-la em 2017.
O Governo prevê também poupar 600 milhões de euros em 2016 com uma reforma do sistema de pensões, mas não adianta como pretende fazê-lo, justificando a ausência de pormenores sobre as medidas a aplicar com a falta de disponibilidade para o diálogo da parte do PS.
Mercado de trabalho
O PS propõe a limitação dos contratos a prazo à substituição temporária de trabalhadores e uma "via conciliatória" na cessação de contratos de trabalho com aumento das indemnizações, que passam para 18 dias nos primeiros três anos trabalhados e, após esse período, para 15 dias por ano trabalhado.
Do lado do Governo assume-se a possibilidade de parar com a redução do número de funcionários públicos entre 2015 e 2019, esperando conseguir uma redução da despesa com pessoal de 1,2 pontos percentuais naquele período, em termos acumulados.
Cenário macroeconómico
Os economistas responsáveis pelo cenário macroeconómico do PS estimam que, com as medidas incluídas no relatório hoje apresentado, Portugal tenha, em 2016, mais crescimento e menos desemprego do que as últimas previsões do Governo.
O grupo de trabalho estima que Portugal possa crescer 2,4%, quatro pontos percentuais acima do que estimou o Governo no Programa de Estabilidade.
No entanto, em relação à taxa de desemprego, os economistas liderados por Mário Centeno preveem que o seu cenário conduza a uma taxa de desemprego de 12,2% em 2016, abaixo dos 12,7% estimados pelo Governo.
Quanto a 2019, o grupo de trabalho do PS espera que a taxa de desemprego caia gradualmente para os 7,4% nesse ano, uma previsão mais otimista do que a do Governo, que espera que o desemprego seja de 11,1% naquele ano.
Finanças Públicas
A equipa de Mário Centeno admite, no seu cenário final, que Portugal feche 2016 com um défice orçamental de 3%, caindo abaixo deste limite apenas no ano seguinte, o que significa que o país só sairia do Procedimento dos Défices Excessivos (PDE) em 2017.
Já o Governo PSD/CDS-PP estimou que, depois de se fixar nos 2,7% em 2015, o défice cairia para os 1,8% em 2016, o que significa que o executivo mantém o compromisso de sair do PDE já este ano.
Para 2019, o último ano da projeção, o grupo de trabalho do PS espera um défice de 1% do PIB, ao passo que o Governo já prevê um excedente de 0,2%.
Quanto à dívida pública, o grupo de trabalho socialista estima que, considerando as medidas recomendadas, o rácio da dívida sobre o Produto Interno Bruto (PIB) fique sempre acima da projeção do Governo.
Os socialistas apontam para os 128,8% em 2016 (contra os 121,5% previstos pelo executivo) e, para 2019, o último ano da projeção, esperam que caia para os 117,6% do PIB (acima dos 107,6% apontados pelo Governo).