Francisco George afirmou, esta quarta-feira, na Assembleia da República, que o risco do ébola em Portugal continua "baixo" e acusou o colégio da especialidade de Saúde Pública da Ordem dos Médicos de alarmismo, "sem justificação".
Corpo do artigo
Perante a Comissão de Saúde na Assembleia da República, o diretor-geral da Saúde afirmou que a Ordem dos Médicos e os sindicatos deveriam ter consultado a "situação epidemiológica", antes de emitir o parecer, divulgado ontem, que afirma que o país não está preparado para lidar com o vírus. O diretor-geral admitiu que, até ao fim do mês, Portugal "pode vir a ter 2, 3, 4 casos de ébola importados" e insistiu que o país está preparado para lidar com isso e que o desafio maior é evitar a contaminação.
Recorde-se que a Ordem dos Médicos considerou que Portugal não está preparado para lidar com o ébola e afirmou que as autoridades de saúde têm "passado mensagens de enganosa tranquilidade" à população. As críticas surgem do colégio da especialidade de Saúde Pública que analisou a atividade da doença.
Assumindo a total responsabilidade do dispositivo atual do país para enfrentar o ébola, George afirmou, logo no início da reunião, que "se notar que o dispositivo montado não tem o apoio ou a simpatia dos membros do Governo e da Assembleia da República, mudam-se os dirigentes da DGS", já que considera não ser possível "caminhar sem ser em conjunto".
"Se isto correr mal, não é uma questão do Ministério da Saúde, do primeiro-ministro, do presidente da República ou dos deputados. A responsabilidade é nossa, de nós os 3", disse, referindo-se a si próprio e aos dois responsáveis que hoje o acompanharam na audição e que integram a estrutura de comando, o presidente do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) e do Instituto Nacional de Saúde dr. Ricardo Jorge (INSA).
O diretor-geral de Saúde insiste que o cenário descrito pelo parecer "não existe hoje". "Nenhum país lusófono tem problemas de cadeias abertas de transmissão mas, se isso vier a acontecer, mudamos o nível de alerta", afirmou Francisco George, admitindo que, se a epidemia chegar à Guiné-Bissau, a situação será mais grave por ser um país com maior ligação a Portugal.
"Quanto mais resolvermos o problema na África Ocidental, mais seguros estaremos. Nunca o mundo teve uma situação com esta gravidade", assumiu.
Parecer polémico
No documento divulgado pela Ordem dos Médicos, assinado por Pedro Serrano, da direção do colégio da especialidade de Saúde Pública, e noticiado esta quarta-feira, os especialistas consideram que "o risco teórico de virmos a ter casos de ébola em Portugal é alto" e que isso está "fortemente associado ao posicionamento de Portugal como país integrante daquilo que se convencionou chamar Países de Língua Oficial Portuguesa".
Os especialistas fazem ainda uma contextualização das relações, geográficas e humanas de vizinhança dos três países onde grassa a epidemia (Serra Leoa, Guiné-Conacri e Libéria) e os países lusófonos com permanente ligação a Portugal: Guiné-Bissau, Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e, mais remotamente (em termos de risco de exportação), Moçambique.
"Dadas as antigas e fortíssimas relações de proximidade e de atual plataforma giratória entre este grupo de países, nenhum outro país europeu está tão em risco de ser contaminado do exterior, a partir dos grandes centros de foco da doença em África, como Portugal", refere o parecer publicado no site da Ordem dos Médicos.
O documento sublinha os sistemas da saúde frágeis destes países, considerando "praticamente inexistente" a vigilância epidemiológica" (particularmente a de nível local).
Os especialistas defender ainda que é "evidente e urgente que seja montada, implementada ou reforçada em Portugal uma apertada vigilância dos aeroportos e portos, o que incluiria uma presença permanente de estruturas de Saúde Pública e a formação em medidas de Saúde Pública do pessoal aeroportuário que controla a entrada de passageiros".
"Seria também importante criar uma base de dados com os portugueses que residem nestes e noutros países de África considerados de risco, de molde a conseguir monitorizar as deslocações entre zonas de risco e a fazer-lhes chegar informação sobre as medidas a adotar para a sua segurança", acrescentam.
No parecer, os especialistas do colégio de saúde pública consideram ainda que Portugal não está preparado para lidar com o vírus do ébola e que as autoridades têm emitido "mensagens de enganosa tranquilidade".
Os mais recentes dados apontam para o registo de 8.917 casos, dos quais 4.447 se revelaram mortais, sendo a Libéria, Serra Leoa e a Guiné-Conacri os países mais afetados pelo pior surto de ébola.