Voltaram as multidões ao Parque da Cidade, no Porto. Primeiro dia do festival arrancou com Pedro Mafama, Penelope Isles e DIIV.
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"Thank you very much, fucking portuguese people. I really love you, like a lot", declarou Nick Cave ao público do Primavera Sound depois de iniciar o espetáculo com "Get ready for love" e "There she goes, my beautiful world". Fê-lo junto às grades, próximo dos fãs, absorvendo a sua energia e entregando-se de coração.
Acompanhado pelos Bad Seeds e por um coro gospel, tudo pareceu mais maníaco e desesperado naqueles primeiros minutos do que na entrada do mítico espetáculo de há quatro anos, no mesmo local. Qual a quantidade de sofrimento que um homem pode suportar? Nick Cave tinha boas razões para cancelar todos os compromissos dos próximos meses. Não o fez quando perdeu o primeiro filho, em 2015, voltou a seguir fielmente a agenda depois do desaparecimento do segundo, há poucas semanas. Que dizer sobre isto? Que talvez fosse pior ficar em casa? Que talvez ajude subir a um palco? Nick Cave começou furioso, frenético, desembestado. Mas no correr do espetáculo foram surgindo todas as magníficas tintas da sua música e toda a beleza das suas letras. Só no resta mesmo um "thank you, fucking Nick".
Horas antes, as primeiras hordas entravam no recinto onde nos últimos três anos apenas se escutou o canto dos pássaros. Mas nada parece ter mudado substancialmente: os mesmos rostos bonitos adornados com grinaldas, t-shirts estampadas com datas de digressões de bandas, alemães enormes com duas cervejas em cada mão - apenas a ocasional máscara fazia lembrar tudo aquilo que perdemos neste intervalo.
Os concertos arrancaram dengosamente, com o público a regressar à sua atividade favorita nos finais de tarde do Primavera: estatelar-se na relva. Pedro Mafama no estrado principal a percorrer o seu inventário de sons lusófonos; os britânicos Penelope Isles a debitarem a sua pop sonhadora atravessada por violinos e guitarras fuzzy. "Estamos um passo mais perto dos Arcade Fire", considerou a vocalista ao apresentar um novo membro da banda. Muita broa e caldo Knorr para serem sequer vistos pelo retrovisor, mas o espetáculo foi competente e ativou o público para o resto da jornada.
A primeira enchente viria com os DIIV, banda de Brooklyn que celebrava os 10 anos do seu álbum de estreia, "Oshin". Praticam um shoegaze musculado, que dança entre a introspeção e a catarse. A secção rítmica é potente e a fragilidade surge nas guitarras, que parecem espalhar pétalas sobre uma combustão. Há reminiscências grunge nos temas mais assolapados e descidas às profundezas nos momentos melódicos. Ficaram espantados com a quantidade de público presente e o entusiasmo que geraram.
Pouco antes de Nick Cave, atuou a australiana Stella Donnely, que se apresentou como Bob Dylan nos anos 1960: caracóis amontoados, guitarra na mão e harmónica presa ao pescoço. A voz límpida deu a conhecer o álbum "Beware of the dogs" e lançou as novidades do próximo trabalho a ser editado em agosto, "Flood". Uma pastoral amena antes da tensão dramática dos autores de "Tender prey."
Apontamentos
Alterações no recinto
Devido às obras de ampliação do Parque da Cidade, houve algumas alterações no recinto do Primavera Sound, nomeadamente nas entradas, na zona da alimentação e no antigo palco Seat (agora Cupra). Nada que baralhasse o público, que marchou de imediato para os concertos.
Feira
Na zona de entrada do festival está montada uma curiosa feira onde se pode adquirir todo o tipo de memorabilia relacionada com as bandas que atuam nesta edição, desde t-shirts, bonecos, isqueiros e canecas. Há também variado artesanato de autor.