Antes de encerrar para cumprir com as diretivas do confinamento geral, o Teatro Rivoli, no Porto, antecipa para esta quinta-feira, às 19.30 horas, a estreia nacional de "Postcards from Vietname" de Raimund Hoghe, que estava prevista para amanhã à noite.
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A história desta produção começa quando Raimund Hoghe compra num vendedor de rua, em Paris, cartões de papel dobráveis de uma extrema fragilidade que retratam pessoas e paisagens do Vietname. Ao ver as imagens nos postais e ao contrapô-las com a guerra do Vietname, percebe como são projeções de um profundo desejo de evasão de quem os faz.
Raimund Hoghe entrelaça canções de protesto dos anos 1960 com arias de Bach e Handel. Mais uma vez escolhe dois bailarinos excecionais, Ji Hye Chung e Takashi Ueno, com quem tem trabalhado nas últimas produções.
Depois de ter apresentado ontem a majestosa Ornella Balestra, ex-bailarina do Béjart Ballet, em "Canzone per Ornella" no Teatro Municipal Rivoli, o público tem hoje a oportunidade de ver a segunda estreia nacional do trabalho do criador alemão.
Como impulso para a criação, Hoghe leva a empatia pelos relegados e transforma-os em vencedores no centro do palco. Estes sempre foram os momentos de catarse numa carreira pontuada pela persistência inabalável. O artista de 71 anos permanece fiel à sua estética, contrariando todas as ideias, práticas ou mesmo correntes que vão aparecendo na dança. Esse é um dos fatores que contribuem para que amantes da dança de todo o Mundo apreciem Raimund Hoghe: uma arte pessoal e intransmissível, não influenciada por modismos.
A história de superação de um homem baixo, com uma corcunda e uma figura muito afastada de um cânone balético, que deixou o mundo da dança rendido, quando em outubro, recebeu o prémio Nacional de dança alemão no Teatro Alto, em Essen. Mas esta não foi a primeira homenagem deste tipo que Raimund Hoghe recebeu na longa carreira.
Raimund Hoghe não é Pina Bausch e há um distanciamento pensado e desejado, mas os dez anos que trabalhou no Wuppertal Tanztheater deixaram a sua marca, e o sítio onde isso se revela indelével é na escolha dos seus intérpretes. Tal como Bausch, Hoghe não escolhe os intérpretes pela técnica ou virtuosismo. Todos eles têm uma singularidade que os equipa com uma capacidade de transmissão fora de vulgar.
Em "Canzone per Ornella" é feita uma ode à bailarina Ornella Balestra, para quem Raimund Hoghe reuniu música e textos de Pier Paolo Pasolini, "tanto os que já foram explorados como os que ainda estão por experimentar, jogando com a capacidade que ela [Balestra] tem de encontrar o equilíbrio perfeito entre virtuosismo e entretenimento, entre presença enigmática e uma figura cinematográfica", escreveu.