Foi uma aparição em grande, uma entrada digna das enormes estrelas rock: soaram as doze badaladas e os três moços dos Muse surgiram em palco perante 83 mil pessoas na Quinta da Bela Vista.
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Ao mesmo tempo, uma panóplia de fogo-de-artifício estalou no ar e alumiou o céu nocturno de Lisboa.
Um vasto oceano de corpos moveu-se com os primeiros acordes de “Mk Ultra” e “Map of problematique”, mas foi a seguir, em “Uprising”, um dos seus mais recentes sucessos, que a terra da Quinta da Bela Vista pareceu tremer enquanto o público cantava “they will not control us”, uma das frases mais emblemáticas.
Era uma multidão de 83 mil em frente ao palco, ontem, à noite, para ouvir os Muse, mas que antes se deixou convencer com a proposta indie dos Snow Patrol. Eles entraram em palco, luzes tímidas, algum fumo, o cantor embrulhado em branco a destilar romantismo: "Tudo isto sabe estranho e irreal/ e eu não vou perder um minuto sem ti", cantava Gary Lightbody. Assim ocorria o início de um concerto que iria contar com a presença da portuguesa Rita Redshoes na canção "Set the fire to the third bar".
Todavia, a primeira grande explosão generalizada de entusiasmo aconteceu antes, ao final da tarde, altura em que os Xutos & Pontapés tocaram "À minha maneira", precisamente quando se assinalavam 23 anos passados desde o momento do calcanhar do Madjer em Viena. A banda nacional também brilhou - como é seu apanágio, aliás -, ao apresentar um repertório em que não faltaram peças do cancioneiro rock lusitano como "Não sou o único" (Madjer foi), "Circo de feras" ou "O homem do leme" (Madjer?).
Àquela hora, a organização anunciava 58 mil pessoas no recinto e divulgava também um estudo "feito por voluntários" que projectava números como 49% do público que disse lá ter ido ontem só para ver os Muse, a banda cabeça de cartaz que só terá actuado muito mais tarde, depois da hora do fecho desta edição.
Antes, os portugueses Fonzie debitaram pouco mais de meia hora de rock FM para punk de almanaque em substituição dos Sum 41, banda que cancelou devido a um problema do baterista. Ao mesmo tempo, no outro lado do recinto, Jorge Palma e Zeca Baleiro distribuiam sintonias e, a dada altura, chegaram a ser surpreendidos pelas presenças de Tim (dos Xutos), João Gil e Rui Veloso.
Todavia, antes disso, e durante a tarde soalheira mas ventosa, foi notório que é sobretudo antes dos concertos terem início que o Rock in Rio se assemelha a uma espécie de Disneyland bombardeada por marketing.
O povo entra na Quinta da Bela Vista e tem à sua mercê uma vasta paleta de atracções, que passam por montanha russa, roda gigante, slide, lojas do arco da velha e, oh oh, inúmeros stands das marcas patrocinadoras que oferecem brindes a granel. A plebe vibra.
Oferecem-se brindes, o povo aceita - ora bem - e faz questão de amelhá-los todos, a torto e a direito: um lencinho aqui, uns óculos escuros acolá, sofás insufláveis para levar para casa, chapéus para a família, apitos, "pins", balões, guitarras de plástico, chinelos ou outros objectos rastejantes não identificáveis.
E ontem, na Quinta da Bela Vista, não era raro vislumbrar indivíduos de braços sobrecarregados e completamente artilhados com toda a panóplia de tralha desse calibre - mas com ar satisfeito de quem cumpriu a sua missão de amealhar tudo aquilo que se lhe deparasse grátis.
À terceira noite, o Rock in Rio-Lisboa regressou às enchentes. O festival prossegue amanhã e termina no domingo, em dia de heavy metal.