Segredos de Paula Rego revelados aos 80 anos no emotivo documentário do filho Nick Willing.
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Um filme é sempre um documento histórico, principalmente quando é contado na primeira pessoa, tornando-se uma forma de congelar o esquecimento e a voracidade da passagem do tempo. Em 2017, Nick Willing, filho de Paula Rego e Victor Willing, decidiu ter uma longa conversa com a mãe e filmá-la, quando ela já tinha 80 anos. A conjuntura tornou-se perfeita, porque quiseram as circunstâncias da vida da pintora que, pouco tempo, depois tivesse uma trombose que a levou a ter alguns lapsos de memória sobre a sua vida.
O filme, "Paula Rego, histórias & segredos" revela, num primeiro plano, que cada história que a pintora desenha não é afinal apenas uma história, mas que tem sempre associado um segredo sobre a sua vida e um episódio pessoal, e isso é o que dá densidade aos seus trabalhos.
Ninguém assiste a este documentário e continua a ver da mesma forma os trabalhos de Paula Rego. Todos os animais ganham rosto e todas as histórias uma nova dimensão, como um abecedário que até aqui estava equivocado.
Aqui aparecem segredos e há sempre latente a questão da sobrevivência e da pertença. Paula Rego era uma mulher o que, à época, socialmente não era a mesma coisa - continua sem o ser - do que ser um homem. Os vários abortos a que se sujeitou, por exemplo, estão aqui expostos. Depois havia a questão do estrangeiro por conselho de seu pai, que rapidamente percebeu que Portugal não seria um país para a filha durante a ditadura, Paula Rego seguiu para Inglaterra, onde afinal continuaria a ser sempre uma estrangeira.
No filme, Nick, o mais novo de três filhos (tem duas irmãs, Victoria e Caroline), usa imagens da família, fotografias e filmes que o avô fazia constantemente. E há um contraponto de Paula Rego, jovem numa Londres dos anos 60, e depois a mesma artista com 80 anos cristalizada dentro da sua criação. Paula Rego aparece sempre fragilizada ao estar em evidência. Passa pelo filme o casamento com o artista plástico Victor Willing (1928-1988), em 1959, e o desmontar do romantismo que começa com um "Tira as cuecas", os casos extraconjugais, a família e os filhos e também a depressão.