O ator português José Condessa interpreta a cena mais escaldante do western gay do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, "Strange Way of Life", um dos filmes em destaque do Festival de Cannes até ao momento.
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É ao som de "Estranha Forma de Vida", cantada em bom português, que começa o western gay de Pedro Almodóvar, "Strange Way of Life". Antes da projeção, a sala explodiu numa tremenda ovação quando o realizador espanhol subiu ao palco.
Uma verdadeira estrela pop, pela capacidade de comunicação do seu cinema e da sua própria personalidade, Almodóvar estava rodeado por alguns dos seus atores, como Ethan Hawke e José Condessa, vestido à Saint Laurent, casa coprodutora do filme, em combinação com a El Deseo, dos irmãos Agustin e Pedro Almodovar.
O filme, reencontro de dois amantes, o xerife de uma pequena localidade do oeste norte-americano e um homem que tenta salvar a pele do filho, acusado de um crime, tem um flashback onde José Condessa interpreta uma das personagens centrais, em jovem, vivendo a cena mais escaldante do filme.
Ethan Hawke e Pedro Pascal têm algumas cenas mais soft, mas se vislumbrar uma nádega do popular ator chileno é a sua onda, então "Strange Way of Life" é o seu filme. Ironia à parte, o filme de Almodóvar é um exercício de estilo muito bem conseguido em torno do western clássico, com a música do habitual Alberto Iglésias a dar ainda uma ajuda.
Com apenas trinta minutos de duração, "Strange Way of Life" mostra que cada filme tem a sua própria duração. Curiosamente, antes do filme do espanhol, tínhamos assistido às quatro horas de "Occupied City", o documentário de Steve McQueen sobre Amesterdão, a cidade onde vive há mais de um quarto de século. Com imagens da cidade hoje em dia, a narração fala-nos do que ocorreu naqueles mesmos locais quando a cidade foi ocupada pelos nazis - nem só de Anne Frank viveu esta cidade ocupada. Mas o filme é também sobre a Amesterdão de hoje, entre manifestações que terminam em confrontos com a polícia e o confinamento causado pela pandemia.
A competição abriu entretanto com um dos casos que marcaram o cinema francês das últimas semanas, "Le Retour", o novo filme de Catherine Corsini. É que o CMC, o centro nacional de cinematografia que financia todo o cinema francês, retirou os 600 mil euros que deliberara entregar à realizadora, por esta não respeitar as regras de uma cena de sexo entre duas jovens menores. O filme ficou fora das primeiras escolhas de Thierry Frémaux, com o Festival de Cannes ao que parece a dar-se mais algum tempo para verificar a veracidade das acusações. Finalmente, o filme seria acrescentado à seleção oficial em competição.
"Le Retour" acompanha o regresso à Córsega de uma mulher negra, com as suas duas filhas adolescentes, ilha que abandonara quinze anos antes. Um regresso a um passado traumático, vivido de forma diferente pelas três personagens, em função do encontro com uma família bem estabelecida da ilha e de personagens que tinham apagado da memória.
Apesar de Corsini não ter manifestamente um estilo muito próprio, parecendo limitar-se a filmar o seu guião e de acabar o filme num "happy end" de quem não tem outra forma mais satisfatória de concluir o seu filme, a trama é comovente e os seus protagonistas suficientemente convincentes para nos fazerem entrar na sua própria história. O racismo imanente na sociedade francesa é um dos vários temas que o filme toca em paralelo.